O conceito de Educação Popular, forjado na contemporaneidade, de acordo com Carlos Brandão e Maurício Fagundes (2016), está relacionado ao período pós-segunda guerra mundial, no contexto chamado de “guerra fria”, que envolveu duas grandes potências mundiais: União Soviética e Estados Unidos da América. Nesse cenário, havia uma disputa pela hegemonia do espaço geopolítico e ideológico global. Nesses confrontos, tinha-se de um lado o bloco socialista composto pela União Soviética, Cuba e China. Do outro, o bloco capitalista, liderado pelos Estados Unidos. Nesse contexto, os autores apontam que essas disputas colocaram em evidência problemas latentes de ordem social no mundo, como o analfabetismo, o desemprego, a saúde, a pobreza, enfim, a insatisfação social generalizada (BRANDÃO; FAGUNDES, 2016). No Brasil, a elite política se posicionou a favor dos Estados Unidos, a fim de garantir a manutenção do seu poder, o que acirrou as tensões no campo político, cultural e social, provocando reações de intelectuais e lideranças ligadas aos movimentos populares, fazendo surgir várias manifestações nesse sentido, como o Movimento de Educação de Base (MEB) em 1961, criado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), com o apoio do governo federal. Esse movimento educacional, segundo Brandão e Fagundes, articulava ações educativas por meio de escolas radiofônicas, direcionada às classes desfavorecidas das zonas rurais das regiões norte, nordeste e centro-oeste. Os autores destacam ainda, as ações educativas desenvolvidas no Brasil pela UNESCO, através do seu programa educacional voltado para os povos subdesenvolvidos realizados entre os anos de 1947 a 1950. Cabe ressaltar que esses projetos educacionais tinham como foco desenvolver um processo educativo baseado em três proposições: Ler, escrever e calcular (BRANDÃO, FAGUNDES, 2016, p.91). Nesse contexto, surge no Brasil, um movimento de educação popular liderado por Paulo Freire, que, segundo Moacir Gadotti (1991) demonstrava um pensamento crítico em relação à educação desenvolvida no Brasil, principalmente aos programas de alfabetização, que surgiram a partir dos anos 1940. De acordo com Gadotti, foi a partir da experiência de Paulo Freire como professor e depois diretor do setor de educação e cultura do Serviço Social da Indústria (SESI), que Freire percebeu que a educação oferecida ali atendia interesses patronais e objetivos assistencialistas, não expressando, portanto, disposição para promover uma educação reflexiva, crítica com vistas a contribuir com o processo de emancipação da classe trabalhadora, ao contrário, visava tão somente instrumentalizar tecnicamente o sujeito social para atender a necessidade da lógica do mercado capitalista. Ainda segundo Gadotti, Freire deu-se conta também que o projeto de alfabetização do SESI não buscava incorporar o valor social, cultural, político e histórico da realidade concreta dos sujeitos. Portanto, tal perspectiva educativa não poderia levar em consideração uma formação integral do sujeito social porquanto se reduzia ao uma prática pedagógica alienante, assentada nos pressupostos de uma educação tradicional. Assim, Freire deparou-se com a impossibilidade de instaurar uma nova perspectiva educacional nos meandros da estrutura organizativa da classe empresarial (GADOTTI, 1991). A partir desse momento, Paulo Freire passou então a investir grande parte de seu tempo e conhecimento, acumulado ao longo de sua vida, na organização de espaços em que se pudessem desenvolver experiências educativas comprometidas verdadeiramente com as classes oprimidas. Decorre desse período o nascimento dos Círculos de Cultura6. Sobre esses referidos círculos, Francisco Weffort, na introdução de uma recente edição da obra de Paulo Freire intitulada “Educação como prática da Liberdade”, tece a seguinte consideração: “o ponto de partida para o trabalho no círculo de cultura está em assumir a liberdade e a crítica como o modo de ser do homem” (WEFFORT, 2018 apud FREIRE, 2018, p, 13). Esse contexto histórico brasileiro fez nascer outro modo de conduzir processos educativos mais favoráveis à emancipação e libertação dos sujeitos das camadas populares. As experiências vivenciadas nos Círculos de Cultura configuraram-se como um dos pilares da concepção de educação popular freireana, a qual apresentaremos a seguir de forma sucinta destacando seus princípios basilares. O primeiro ponto importante a ser destacado na busca por uma compreensão conceitual do que seja educação popular na concepção de Paulo Freire7 está diretamente vinculada à ideia da relação entre educação e vida política: Entendo a educação popular como o esforço de mobilização, organização e capacitação das classes populares científica e técnica. Entendo que esse esforço não se esquece que é preciso poder, ou seja, é preciso transformar essa organização do 6O círculo de cultura, segundo Gadotti (1991, p.147, 148), é uma unidade de ensino que substitui a escola tradicional. É formado por um grupo de pessoas que se reúnem para discutir seu trabalho, a realidade local e nacional, sua vida familiar e etc., Nele, não há lugar para o professor tradicional (“bancário”), que tudo sabe; nem para o aluno que nada sabe. Assim, ao mesmo tempo que aprende a ler e a escrever, o educando aprende a “ler”, isto é, analisar sua prática e atuar sobre ela. 7A conversa de Freire com Nogueira (1993) registrada na obra “Que fazer – Teoria e Prática em Educação Popular. poder burguês que está aí, para que se possa fazer escola de outro jeito. Em uma primeira “definição” eu a aprendo desse jeito. Há estreita relação entre escola e vida política (FREIRE, 1993, p. 19). Para Freire, a educação como ato político deve resultar em uma mobilização consciente para uma prática de intervenção diante das demandas sociais e de enfrentamento das forças ideológicas e políticas exercidas por grupos sociais detentores do poder, que negam aos sujeitos oprimidos direitos legítimos e inalienáveis como ser humano. Nesse sentido, compreende-se que não há neutralidade na ação educativa, isto é, todo ato educativo traz em si posicionamentos e intencionalidades políticas em favor de uma determinada classe ou grupo social. Importa salientar na perspectiva de Freire, que o educador popular necessita ter clareza do poder da ação educativa, a qual deve estar inter-relacionada com o compromisso de transformar, reinventar a vida social sob a orientação das classes populares. O ato educativo popular, portanto, implica no diálogo e no enfrentamento da realidade opressora, negando-se a reproduzir a lógica do poder autoritário e coercitivo hegemônico, bastante comum na estrutura da educação moderna tradicional. Nesse sentido, a educação como pratica política, implica na expressão de gestos concretos em favor da libertação dos sujeitos e na transformação profunda da realidade social (FREIRE, 1993, p. 19-21). Outro aspecto a ser considerado na proposta freireana de educação popular diz respeito à sua forma muito particular de organizar os saberes. Indo na contramão da educação tradicional, a educação popular não prescreve um programa, pois sua base cognitiva é inventada pela vida do povo. Ou, de outro modo, os saberes e temas de estudo nascem do diálogo e da relação vivencial do educador com o povo e sua realidade concreta. Como enfatiza freire: “Não há um programa, inexiste nessa pedagogia um programa preestabelecido de conteúdo a serem estudados”. No entanto, segundo Freire, essas pessoas se ensinam umas às outras, “elas se medem” em atos grupais de conhecimento (FREIRE, 1993, p. 19-21). A partir dessas considerações, depreende-se que cabe ao educador popular dialogar com os sujeitos na perspectiva de construir caminhos que possibilitem a reflexão crítica do mundo e a conscientização da necessidade urgente de lutar por uma sociedade mais solidária e menos desumana. O educador popular em parceria com os educandos devem buscar saídas para superar o estado de subalternidade, humilhação e opressão, imposta por aqueles que detêm o poder. Além disso, o educador precisa ser um articulador de convivências criativas capazes de nutrir utopias como força propulsora de uma educação política capaz de alargar o senso crítico em relação às várias opressões existentes no campo social, econômico, cultural e ideológico (FREIRE, 1993, p. 21-23). Outro aspecto da educação popular freireana, merecedor de destaque, refere-se categoricamente à “pedagogia da pergunta”. A pergunta como princípio reflexivo, segundo a ótica de Freire, não permite que o pensamento fique circunscrito ao mero consumo de respostas sem a devida problematização, sem a exploração daquilo que a pergunta oferece de curiosidade. Ele afirma que a pergunta se constitui como um elemento fundamental para o exercício da pedagogia popular, também porque ela implica em observação e ação crítica não favorecendo atitudes passivas diante das necessidades reais. Em outras palavras, o lugar da educação popular não poderá se configurar como um ambiente em que os sujeitos irão simplesmente consumir respostas prontas e definidas sobre suas inquietações, hesitações, curiosidades a respeito da própria vida e do mundo (FREIRE, 1993, p. 35). Outra característica da educação popular de Freire que atravessa todo seu trabalho refere-se à linguagem utilizada na construção de conceitos e nos diálogos com os grupos populares. O educador precisa ter sensibilidade para não deixar que sua variante linguística, muitas vezes técnica, acadêmica, formal, se imponha como barreira comunicativa com os grupos populares. Seguindo em outra direção, esse profissional deve se permitir a aprender e valorizar a beleza da linguagem do povo na perspectiva de facilitar processos de comunicação e aprendizagem, Freire argumenta: Temos um comando manso sobre a linguagem (sobretudo a escrita). Se não temos esse comando manso sobre a linguagem, há o risco de nos fazermos formais e impessoais. Ou seja, o uso da linguagem já é ato de conhecimento na medida em que ela favorece ou distancia nossos mergulhos dentro das práticas da luta popular (FREIRE, 1993, p. 36). Há nesses argumentos dois movimentos pendulares fundamentais a serem feitos pelo educador comprometido com a luta do povo. Primeiro, deve antever com clareza o perigo de se fechar na formalidade e impessoalidade por meio de seu modo de articular e interagir com a cultura popular através do uso de uma linguagem forjada no mundo acadêmico. Depois, precisa atentar para o fato de que a arrogância linguística tende a construir muros capazes de impossibilitar uma maior e melhor compreensão sobre o que o povo verbaliza a respeito de seus anseios, de seu universo social cultural e político. Por isso, o educador necessita saber contextualizar sua ação pedagógica e fazer o movimento pendular do “ir e vir”, isto é, deve mergulhar na cultura popular e emergir da mesma a fim de buscar outro horizonte de compreensão de forma que estreite a convivência e a troca de experiências e de saberes. Isso porque os trabalhos desenvolvidos por Freire com diversos setores populares, revelou que a dificuldade de “entendimento” desses sujeitos, tem menos haver com a complexidade dos temas e teorias e mais com a variante de linguagem utilizada pelo educador no processo de ensino-aprendizagem (FREIRE, 1993, p. 36-38). A ótica crítica de Paulo Freire chama-nos a atenção para a relevância de mais um princípio fundamental e norteador da ação educativa popular: a relação intrínseca entre teoria e prática. Para Freire, essas duas dimensões do trabalho educativo devem caminhar juntas. Na ocorrência de rupturas indevidas, ao longo do processo, inevitavelmente a teoria e a prática perderão substancialmente o sentido que tem para a ação educativa e para a vida em sociedade. Por isso, segundo Freire, devemos aprender a não separar o ato do saber, a não romper pensamento da ação, para não estragarmos a teoria, tendo em vista que toda vez que ocorre esse tipo de rompimento, há um rompimento “Entre”, e com isso, se perde em praticidade, tornando-se uma espécie de “papagaio falador” de teorias, mas teorias menos densas. Freire entende que não se deve aceitar a separação entre conhecimento e ação, “ato e saber”. Tais esclarecimentos nos permitem inferir que caso ocorra separação entre atitude e pensamento, entre que o se diz e o que se faz, ou seja, entre teoria e prática, elas tendem a se degenerar em demasiadas confusões de entendimento. Dessa forma, a teoria torna-se mera reflexão esvaziada de sentido e a prática perde sua coerência social (FREIRE, 1993, p. 37). As questões levantadas por Freire que evidenciam a necessidade de ação e pensamento caminharem juntos, expressando gestos, palavras e sinais diversos, evidenciam o perfil do educador popular. Para tanto, sua práxis precisa ser dotada de uma preocupação dialógica para construir com o saber da cultura popular o projeto social que seja favorável às exigências demandadas pelos excluídos. Nesse contexto, o educador popular, se educa educando, por estar imbuído de disposição e compromisso para ouvir e perceber de forma sensível histórias, emoções, olhares, para juntos, educador e educandos, articularem ações educativas que se coloquem no enfrentamento dos problemas sociais (FREIRE, 1993, p. 38). O educador popular entendido nos princípios freireanos tem como propósito construir a mobilização social, a conscientização para a libertação. É nesse sentido que a educação popular tem como objetivo promover a consciência crítica e problematizadora, por meio do estímulo à convivência participativa e questionadora. Para tanto, essa ação educativa deve prescindir da convencional postura tradicional domesticadora a qual impede o processo de libertação dos oprimidos. Freire insiste no processo dialógico como um dos instrumentos indispensáveis a prática educativa popular. Entende-se com isso, que o educador necessita de humildade para reconhecer suas limitações e buscar flexibilidade que o ajude a rever seus conceitos e valores. Por quanto, sabe-se que no desdobramento do processo educativo popular, há desafios a serem vencidos, uma vez que existe o tempo necessário para que a maturação da ação educativa se consolide materializando-se na transformação do sujeito social (FREIRE, 1993, p. 45-53). A educação popular defendida por Paulo Freire influenciou e continua a inspirar pensadores comprometidos com projetos educacionais no Brasil e em outros países do mundo, os quais vêm contribuindo significativamente para implementar um projeto contra hegemônico de educação. Nessa direção, Nicolás Guevara (2005) aponta que a educação popular é reconhecidamente relevante como ferramenta para se trabalhar as bases norteadoras de uma pedagogia crítica libertadora que incida no contexto social, político e cultural, a fim de possibilitar processos de humanização. Cabe especificar que, segundo a ótica de Guevara, a educação popular não quer somente representar o sujeito a qual se destina, mas a intenção social política que propõem. A partir desses pressupostos, há pontos que demarcam e são necessariamente iluminadores como motivação pedagógica popular, como as experiências de formação para uma cidadania ativa e participativa dos sujeitos sociais (GUEVERA, 2005). Diante desses aspectos, Guevara “lança luzes” sobre alguns elementos que fazem parte da cosmovisão da educação popular: o contexto e a pratica como referência; o reconhecimento do sujeito como um ser capaz de provocar mudanças no âmbito da sociedade e, articulação entre o pedagógico e o político. Esses componentes são partes da intencionalidade social e política emancipadora, pois permitem desnudar que o ato educativo não é neutro e sua operação é fundamental para veicular um claro posicionamento em consonância com a realidade dos sujeitos populares. Guevara explicita, em seu estudo, a preocupação com o perigo de um componente sobressair-se sobre os demais, pois isto implicaria numa desestruturação na proposta educativa. Interessante notar ainda, que Nicolás Guevara mostra-se um intelectual atento aos rumos da educação popular na América Latina. Para ele a ação educativa nesse campo, vem se realizando com tônicas diferenciadas dependendo das organizações e entidades que a promovam: A educação popular desenvolve-se com ênfase diferentes, segundo os grupos políticos, sociais e eclesiais que a impulsionam: setores de esquerda partidária, comunidades eclesiais de base, instituições de pesquisa e educação, que assumem esta perspectiva de formação com matizes próprios de diferença. Mas todas estas vertentes tinham como fundo a proposta de Freire (GUEVERA, 2005, p.219). Guevara identifica em sua investigação, nuances diferenciadas da ação educativa, entretanto reconhece que todas, independente das diferenças, seguem princípios oriundos da matriz freireana, a qual compreende alguns dos seguintes aspectos: ação educativa popular exige compromisso e tomada de posição ao lado das classes marginalizadas; a construção do conhecimento deve partir das necessidades reais dos sujeitos; mais relevante do que o domínio de metodologias é a clareza da opção política por parte do educador (GUEVERA, 2005, p.220). Guevara traz ainda, uma síntese das características da educação como uma prática centrada na realidade concreta, do mundo dos sujeitos, dos setores populares; é um processo sistematizado e investigativo que compõem crítica, dúvida, análise e atuação; propõem uma leitura crítica do caráter injusto da sociedade e do papel que tem a educação na sua reprodução; percebe os sujeitos populares como protagonistas do seu próprio aprendizado e atores da sua emancipação; explicita o conflito social; dá ênfase nos processos de aprendizagem e não nos resultados (GUEVERA, 2005, p.221). Guevara apresenta ainda considerações sobre Educação Popular como uma pedagogia voltada a prática e a ação transformadora; a prática como base geradora de pensamento; uma permanente crítica do contexto; ação educativa com posicionamento e intencionalidade social e política emancipadora; o diálogo e o conflito como fatores constitutivos de processos democráticos; o gosto pela curiosidade, mediado pela pedagogia da pergunta, revalorização dos valores éticos do ser humano universal (GUEVERA, 2005, p.221). Pode se dizer em linhas gerais que estas foram as contribuições apresentadas por Guevara, em sua exposição, para a compreensão da proposta pedagógica no campo da educação popular, deixando em aberto, outras possibilidades. Nessa mesma direção, Moacir Gadotti (2003) buscar elucidar a educação popular situando-a, porém, no contexto da escola pública estatal, ou como ele mesmo a denomina “escola pública popular” (GADOTTI, 2003, p.163). Em seu estudo Gadotti (2003), identifica críticas que expressam dois sentidos opostos os quais estão relacionados à escola pública popular nas últimas décadas do século XX no Brasil. O conservadorismo em sua base conceptiva prioriza uma escola pública burguesa favorável à manutenção do status quo. Tal posição considera os ensinos privado e público como duas modalidades antagônicas que se excluem mutuamente. A posição progressista, por sua vez, defende uma escola pública não burguesa criada e mantida pelo Estado sob o controle da sociedade civil. (GADOTTI, 2003). Para Gadotti, a histórica de notória precariedade da educação pública no Brasil, amplia a responsabilidade do Estado com a sociedade como um todo. Dessa maneira, o autor posiciona-se declaradamente em defesa da escola pública mantida pelo Estado, porém controlada pela sociedade civil. No tocante a sua compreensão de Estado, é oportuno destacar algumas questões relevantes. A primeira refere-se àqueles que não acreditam na possibilidade de construção de um Estado democrático, porque entendem que o Estado sempre será autoritário. Por conta disso, muitos educadores acabam aderindo a postura de desobrigar o Estado de exercer seu papel de mantenedor da educação, e endossam, por outro lado, o argumento do ensino empresarial alicerçado na lógica do lucro. A segunda questão refere-se ao Estado na perspectiva gramisciana, que não o concebe sem a participação ativa e crítica da sociedade civil. Visto sob esta ótica, o Estado compreende a forma democrática em que a sociedade política e a sociedade civil encaminham as ações, mantendo uma “unidade de contrários, não necessariamente antagônicas” (GADOTTI, 2003, p. 164-165). Nesse sentido, alerta Gadotti que a transformação de um Estado autoritário burguês em um Estado democrático não será uma dádiva dos que detém o poder, mas uma conquista das classes populares. Portanto, para o autor, as bases fundamentais da educação popular no contexto da escola pública estatal requerem que a educação (enquanto território político e ideológico em disputa) seja comandada pela sociedade civil organizada, para que assim possa cumprir seu papel indispensável na construção da soberania popular e na consequente emancipação da sociedade como um todo (GADOTTI, 2003). Nesse contexto, Gadotti postula um conceito de educação pública popular que expresse em sua significação a valorização da vida e das experiências cotidianas dos sujeitos sociais. Tal diretriz tem como intencionalidade uma escola pública de tempo integral para alunos e professores, o trabalho associado ao lazer e abolição do trabalho infantil, o qual só poderá ser formativo se tiver articulado com a escola. Diante disso, a educação pública popular caracteriza-se por fomentar transformações sociais, tendo em vista o fortalecimento da sociedade civil que integra as diversas categorias de educadores e trabalhadores ligados pelos serviços públicos e educacionais. Desse modo, pode-se evitar a fragmentação da educação pública – intenção decorrente da prática burguesa. Ademais, a educação pública popular oferecida pelo Estado deverá incorporar em sua estrutura as orientações socialista e democrática devendo ser crítica, criativa, gratuita e universal, de livre acesso a todos (GADOTTI, 2003). As considerações tecidas pela análise crítica de Gadotti deixam ver que a educação |