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Este é um termo muito utilizado em praticamente todas as considerações sobre os problemas das cidades atualmente. No entanto, tenho percebido que não são muitas as pessoas que conseguem definir com clareza o que seja especulação imobiliária. Na maioria dos casos, elas associam o termo à construção de prédios em altura e, mais especificamente, a uma intensa ocupação do solo urbano. Mas será que é isso que significa especulação imobiliária? Campos Filho (2001, p. 48) define especulação imobiliária, em termos gerais, como […] uma forma pela qual os proprietários de terra recebem uma renda transferida dos outros setores produtivos da economia, especialmente através de investimentos públicos na infra-estrutura e serviços urbanos[…]. A especulação imobiliária, portanto, caracteriza-se pela distribuição coletiva dos custos de melhoria das localizações, ao mesmo tempo em que há uma apropriação privada dos lucros provenientes dessas melhorias. A forma básica da especulaçãoMas o que isso quer dizer? Como é possível “melhorar” uma localização se ela não pode ser mudada? Afinal de contas, um terreno é um bem imóvel. Essas melhorias que acabam valorizando os terrenos podem dar-se de muitas formas; as mais comuns referem-se à provisão de infra-estrutura (água, esgoto, energia), serviços urbanos (creches, escolas, grandes equipamentos urbanos) e às melhorias realizadas nas condições de acessibilidade (abertura de vias, pavimentação, sistema de transporte, etc.). Esquema básico de funcionamento da especulação imobiliária. Elaboração: Renato Saboya. Tais melhorias, quando realizadas no entorno de um terreno, acabam agregando-lhe maior valor. Terrenos com boa infra-estrutura são mais caros que terrenos sem nenhuma infra-estrutura. O mesmo vale para a pavimentação das vias. Outro caso relativamente comum é o de terrenos que não são muito bem localizados, até que uma nova avenida ou rua importante é aberta, melhorando suas condições de acessibilidade. Seu preço, por consequência, acaba aumentando quase que instantaneamente. Outra forma de melhoria da localização acontece pelo simples acréscimo de novas edificações no seu entorno, o que por si só torna sua acessibilidade melhor em relação ao conjunto da cidade. Em outras palavras, a ocupação por atividades (residenciais, comerciais, etc.) ao redor de um terreno torna-o mais próximo – e portanto com maior acessibilidade – a uma nova gama de possibilidades de interação com o resto da cidade.Essa possibilidade de interação, por sua vez, é um aspecto valorizado pelas pessoas no momento de escolher um determinado local e, por isso, acaba também contribuindo para o aumento do preço do solo. Por que a especulação imobiliária é injusta?Como vimos, o que se chama de “melhoria” de uma localização é o processo através do qual a qualidade da localização de um terreno em relação à disponibilidade de infra-estrutura e a outros terrenos (e portanto a outras atividades e centros de interesse) é aumentada. Dessa forma, os terrenos chamados “de engorda” ficam vazios, à espera de que o desenvolvimento da cidade se encarregue de valorizá-los, sem que nenhum investimento tenha sido feito pelo proprietário (a não ser, é claro, o IPTU, que no entanto é irrisório comparado à valorização da terra). Todo o investimento foi feito pelo Poder Publico, principalmente no caso das infra-estruturas, e por outros proprietários privados. Muitos contribuem para a valorização, mas poucos ficam com os lucros. Para entender esse ponto de vista, é interessante fazer uma comparação: imagine um empreendedor qualquer, que queira ter lucro através da realização de uma determinada atividade. Para conseguir isso, ele tem que investir uma certa quantia de capital e correr um risco, proporcional à probabilidade de o negócio dar certo ou não. Os ganhos, por sua vez, também serão proporcionais ao risco corrido. Ele presta um serviço que, de uma maneira ou de outra, é útil à coletividade e, em troca desse serviço prestado, recebe sua compensação financeira. Nesse processo, ele gera empregos e movimenta a economia. Por outro lado, o especulador imobiliário que investir a mesma quantia de capital em um terreno ocioso não está contribuindo em nada para a sociedade. Não gera empregos, não presta nenhum tipo de serviço, e pior: ainda traz inúmeros prejuízos para a coletividade, conforme será visto mais adiante. Ainda assim, por causa da valorização imobiliária conseguida através de investimentos feitos por outros setores da sociedade, alcança lucros muitas vezes bastante grandes. A dispersão urbana e a especulaçãoOutra maneira de “melhorar” a localização de uma área é melhorar a qualidade dessa localização em relação ao resto das áreas disponíveis no mercado, através do acréscimo de novas áreas que sejam piores que elas. Assim, às vezes o preço de um determinado terreno sobe sem que haja nenhuma modificação no seu entorno. Isso acontece porque loteamentos são criados nas piores localizações, normalmente na periferia, isolados do tecido urbano e em condições precárias de infra-estrutura. Entretanto, mesmo esses loteamentos têm que, no mínimo, cobrir seus gastos de produção e conferir algum lucro ao empreendedor, definindo, portanto, os menores preços do mercado de terras. Especulação imobiliária decorrente da “periferização”. Elaboração: Renato Saboya. Com isso, o “ranking” de localizações é rearranjado, pela introdução, na sua base, de uma nova “pior” localização. As outras localizações, por consequência, passam a ser mais valorizadas, por estarem agora mais “distantes” da pior localização e mais próximas das áreas mais interessantes da cidade, ao menos em comparação com essas novas áreas que agora passaram a fazer parte do tecido urbano. Quando um terreno deixa de ser uma das piores localizações, pela adição de novas piores localizações, seu preço sobe automaticamente. Na maioria das vezes, esse mecanismo está associado também à forma mais básica da especulação imobiliária, uma vez que deve ser feita provisão de infra-estrutura para atender a essas piores localizações, e que essa infra-estrutura acaba passando pelos terrenos mais bem localizados, valorizando-os ainda mais. Os problemas urbanos gerados pela especulação imobiliáriaApesar de gerar lucro para alguns poucos investidores, a prática da especulação imobiliária é extremamente prejudicial para as cidades. Por causa dela, os tecidos urbanos tendem a ficar excessivamente rarefeitos em alguns locais e densificados em outros, gerando custos financeiros e sociais. A infra-estrutura, por exemplo, é sobrecarregada em algumas áreas e subutilizada em outras, tornando-se, em ambos os casos, mais cara em relação ao número de pessoas atendidas. A especulação gera maiores distâncias a serem percorridas, subutilização da infra-estrutura e aumento artificial do preço da terra. As dificuldades de deslocamento da população de mais baixa renda, especialmente nas grandes cidades, também é, em grande parte, decorrente dessa lógica especulativa, que aumenta as distâncias entre habitação e empregos. A urbanização de “piores” localizações empurra a ocupação para lugares cada vez mais distantes, e com isso as distâncias que os novos moradores têm que percorrer acabam aumentando. Outra possível consequência da retenção especulativa de imóveis é a dificuldade de deslocamento gerada pela escassez de vias e de possíveis caminhos para quem se desloca. Isso acontece quando os terrenos ociosos são grandes, e impedem o surgimento de conexões entre áreas da cidade pelo fato de não estarem parcelados. Todo o fluxo, portanto, precisa desviar-se dessas glebas, causando estrangulamento em alguns pontos e concentração excessiva de tráfego em algumas poucas ruas. Possíveis soluçõesDiante da constatação desse problemas advindos da especulação imobiliária, alguns instrumentos urbanísticos vêm sendo utilizados para tentar coibi-la, com destaque especial para aqueles regulamentados pelo Estatuto da Cidade. O IPTU progressivo no tempo, por exemplo, permite ao poder público sobretaxar aqueles imóveis que não estiverem cumprindo sua função social, isto é, que estiverem sendo subaproveitados em áreas que possuam infra-estrutura. A outorga onerosa do direito de construir busca recuperar parte dos investimentos do poder público em infra-estrutura decorrentes do aumento de densidade acarretado por aquelas edificações cuja área ultrapasse a área do terreno (coeficiente 1). A contribuição de melhoria permite que o poder público cobre dos proprietários beneficiados por obras de melhoria urbana o valor do investimento. Entretanto, a aplicação de tais instrumentos nem sempre são implementadas, mesmo com a nova leva de planos diretores participativos, principalmente por causa de hábitos e crenças há muito tempo arraigados na cultura do brasileiro. Como explicar a alguém que sempre viu seus pais e avós segurando a venda de terras para esperar os melhores preços que agora ele não poderá mais fazer isso, sob pena de pagar mais impostos? Tarefa difícil, mas que deve ser levada a cabo paulatina e constantemente, para que seja possível modificar essa mentalidade e criar cidades mais justas para todos. Referências bibliográficasCAMPOS FILHO, Candido Malta. Cidades brasileiras: seu controle ou o caos. 4 ed. São Paulo: Studio Nobel, 2001. Veja também:david says: 10 anos ago
Olá Renato Saboya. Você errou completamente o conceito de especulação imobiliária. A especulação não é a valorização e muito menos é a causa da valorização – ela é um dos efeitos da valorização imobiliária. A palavra especulação deriva do radical indo-europeu spec, o mesmo de espelho, esperança, esperar. Um cientista, por exemplo, especula um resultado, ou seja, ele espera que seu experimento tenha um sucesso (ou fracasso). Do mesmo modo, uma pessoa que compra um terreno para especular esperando por sua valorização, espera no futuro vender aquele terreno e ganhar um lucro. É o mesmo que qualquer outro empreendedor ou mesmo qualquer outra pessoa que aja; ela espera, especula, que sua situação futura seja mais satisfatória que a situação original, caso contrário ela jamais teria agido. Se a especulação imobiliária por si só gerasse valorização, seria necessário questionar o fato de as pessoas não especularem com outras coisas que possuem maior liquidez, como carros, roupas etc. Por que especular com terrenos e imóveis? Pra responder a essa pergunta tenho que esclarecer mais uma confusão que você está fazendo: o valor não é objetivo, não é inerente ao terreno ou ao imóvel, ele não surge da construção na vizinhança e nem mesmo dos investimentos públicos. Muito pelo contrário, o valor é subjetivo, é o consumidor que, ao agir, determina qual o valor de algo. Se o valor fosse objetivo quem determinaria o valor seria o dono do imóvel e por que ele venderia por $500 mil se poderia determinar o preço de $800 mil? (Caso você questione esse fato, sugiro procurar o livro princípios de economia política de Carl Menger, você adquiri pdf gratuito na internet). Quem determina o preço é o consumidor e é claro que ele valorizará mais o terreno que para ele tiver maiores qualidades, entre elas toda a infraestrutura, a diversidade da região, a qualidade ambiental, a vizinhança etc. Mas não é por esse fato que o valor será determinado objetivamente, como se fosse uma característica agregada do imóvel. Quem valora é o indivíduo, aquele que compra. Se o valor dos terrenos aumentasse pelos investimentos públicos no entorno, seria interessante perguntar às pessoas de uma vizinhança pacata e familiar se elas gostariam de um presídio ao lado de suas casas. Os recursos seriam tão públicos quanto os recursos para a construção de um parque ou de qualquer outro serviço público, mas será que eles aumentariam os preços desses imóveis? Certamente não. Esse pequeno exemplo baseado na teoria subjetiva do valor destrói a falácia dos investimentos públicos que você citou. Você poderia dizer que os especuladores, quando consumidores de terrenos, aumentam a demanda e assim forçam os preços a subir. Você estaria certo, mas para ter lucro ele teria que vender e ao vender, toda essa demanda não estaria sendo agora revertida em oferta, o que forçaria os preços a cair? Certamente que sim, pois é impossível haver mais especuladores que imóveis, por definição. Aqui entra uma outra questão chave – a relação entre oferta de dinheiro fiduciário na forma de crédito e a oferta imobiliária. Veja bem. Em uma economia livre, quase certamente a moeda de troca seria o ouro e ela não seria manipulável como ocorre com o dinheiro estatal. Nessa economia, não haveria financeirização de bens de consumo, como imóveis por exemplo. Caso a demanda por imóveis fosse grande e gerasse uma valorização, outros setores da economia tenderiam a sofrer redução de preços, pois o dinheiro é um bem escasso e existe uma lei econômica chamada de Lei de Say. Caso algumas cidades tivessem uma grande procura devido à migração, as cidades que sofreram redução de população teriam que demonstrar uma queda de preços pela maior oferta imobiliária. O problema é que os preços dificilmente caem, apenas sobem e por quê? Porque o governo imprime dinheiro do nada, frauda a moeda, e oferece esses recursos na forma de crédito sem um lastro em produção anterior – como se papel pintado fizesse a mágica de produzir edifícios. Esse dinheiro sem lastro entra na economia majoritariamente nos setores financeiro – bolsa de valores – e imobiliário. A partir desse momento começa a haver uma grande valorização imobiliária, o que ascende a possibilidade de lucros na compra de imóveis como investimento, passa a existir uma financeirização imobiliária e muitas pessoas retiram sua poupança de outros investimentos produtivos para investirem em imóveis, especularem que no futuro venderão com lucro. Lembre-se, o fato de manter um terreno ocioso não faz os preços subirem, mas é justamente essa valorização de preços que faz com que haja um maior número de pessoas que manterão um terreno ocioso para colherem maiores lucros no futuro. Portanto, se você quiser encontrar a causa do aumento de preços de imóveis, procure no Banco Central, não na atividade empreendedora. Mas voltemos ao caso de uma sociedade livre, qual seria o papel do especulador imobiliário, aquele que compra terrenos e imóveis como investimento, com o intuito de vender esses bens com algum lucro no futuro? O papel dele é justamente alocar o terreno não no espaço, mas no tempo, ele é um empreendedor que percebe uma tendência de valorização e investe nessa tendência; ele se arrisca. Dificilmente ele conseguirá lucrar como carona de investimentos de outros, apesar de ser possível. Para ele lucrar, ele terá que investir produtivamente, terá que criar valor para que as pessoas, terá que investir para a sociedade e não se aproveitar da onda de dinheiro sem lastro e improdutivo que o governo imprime diariamente e distribui na forma de programas habitacionais, dinheiro este que apenas favorece os mais ricos em detrimento dos mais pobres, justamente pelo fato de terem acesso anterior a essas notas frescas produzidas no dia.
david says: 10 anos ago
Olá Professor Renato. Boa tarde. Fico grato com a sua resposta. Bem! Ambos concordamos que discordamos de sua definição. Meus argumentos são todos baseados na teoria subjetiva e é devido a ela que encontrei discordâncias com o seu artigo. Caso você também se baseasse na teoria subjetiva, simplesmente não estaríamos aqui. Disso posso concluir apenas que: ou minha teoria subjetiva está errada, pois você também a usa e ambos discordamos, ou você se apóia na teoria objetiva. Não há meio termo entre elas: ou o preço surge da utilidade marginal decrescente, ou ele surge do valor-trabalho. As escolas que tentam misturar as duas teorias supondo que o valor é subjetivo, porém pode ser mensurado objetivamente (como Alonso e von Thünen) caem na matematização da ação humana e tiram conclusões tão erradas quanto as da teoria objetiva, como a idéia de se poder mensurar a valorização sem o processo de mercado; e suas sugestões são todas intervencionistas, o que acaba resultando em piora do próprio cenário que se queria melhorar. Mas não entrarei nessa discussão. Você afirma que refuta meu argumento. Há duas formas de refutação: a empirista e a racionalista. Empiricamente você teria refutado meu argumento caso eu tivesse dito que você escreveu “objetivo” na sua definição, algo que logicamente você não fez e está lá para todo mundo ver, basta induzir. Só que eu não disse isso, eu afirmei que a teoria objetiva estava “implícita” na sua definição e aparecia claramente nas suas conclusões e sugestões e isso nem todo mundo vê. Para isso eu trouxe minha argumentação para o campo racionalista (o que é trabalhoso, não forçoso) e deduzi as conclusões possíveis segundo o princípio da causalidade – não fugi disso. Aqui, para você me refutar, teria que se utilizar da lógica e o pilar da lógica é a não contradição. Você teria que mostrar que meus argumentos, fundamentalmente, são contraditórios e os seus não. Só que você acaba marcando um gol contra e diz que a minha conclusão da sua definição é possível, todavia não é a única, o que acaba corroborando meu argumento, e pior, relativiza a sua definição – é recomendável não relativizar definições epistemologicamente falando. Item 1 – Sim, eu li a sua palavra melhoria e por isso dei o exemplo da praça que no começo é algo que valoriza o espaço e depois, por razões adversas, desvaloriza. Só que a sua definição não permite esse tipo de análise temporal (processual), apenas factual e estática. Acredito que você não exclui o tempo nas suas análises, estou certo? Vi lá que você fala do tempo, mas não assume ele integralmente no seu artigo. Arquitetos costumam analisar o espaço, mas não podem se esquecer do tempo e que uma cidade é um sistema complexo, não uma unidade como uma residência, por exemplo. Item 2 – disse que sua definição é parcial porque considera apenas os lucros, não a melhoria, e para não ter dúvida citei o exemplo da praça, que nem é difícil de ocorrer. Além disso, expliquei o lucro e a expectativa do especulador e a existência de especuladores mal sucedidos. Depois você novamente afirma que minha conclusão (que parte da sua definição) é correta. Depois você fala exclusivamente das externalidades, incluindo o NIMBY, que na literatura internacional é tratado sob esse tema e não como especulação. Depois você novamente relativiza sua definição, dizendo que ela é exclusiva do planejamento urbano e não o que é entendido dentro de outras ciências, como na economia. Só que ela me parece ser exclusiva do planejamento urbano brasileiro, porque na literatura internacional “real estate speculation” é tratado sob a definição que eu dei e os “problemas” discutidos são os problemas do carona – que nem são problemas também se analisado a fundo. E no final você trata novamente do conceito que você utiliza e que a meu ver seria mais correto se você falasse dos problemas da externalidade. Item 3 – concordo com praticamente tudo, menos com o fato de que você não se baseia na teoria objetiva. Seu exemplo do cara que vai morar na rua escura (ou o outro do mercado) é perfeito para explicar a especulação segundo a teoria subjetiva e sob a praxeologia (acho que estamos começando a concordar). O sujeito assume todos os riscos (custos), financeiros e subjetivos (emocionais etc) na “expectativa” de, por assim estar agindo, alcançar uma melhor situação de que estaria caso não agisse (fosse para outro lugar ou ficasse no mesmo, por exemplo) e, além disso, espera que sua situação futura melhore com a ação das outras pessoas (externalidade positiva) e que com isso “pegue carona” e depois de um tempo se satisfaça (lucros) tanto financeiramente como com qualquer outra forma de satisfação (segurança, mercadinho, luz etc). E você falou bem, ele assume um risco. Caso ele especulasse e não se satisfizesse, ele teria prejuízos. Pô, Renato! Se você continua com essa definição seu artigo vai mostrar uma outra realidade completamente diferente e você vai perceber que os problemas não estão na especulação, mas no intervencionismo, principalmente o monetário. Item 4 – já foi discutido e, como disse, não nego que a melhoria no espaço afete os preços. Porém, ela não explica a disparada dos preços como ocorre nos booms e nem a quebradeira e os imóveis vazios dos estouros de bolha. Já expliquei isso também citando a TACE. Não o acusei de ser falacioso. Disse que os teóricos que se baseiam na teoria do valor objetivo acabam criando falácias por se basearem em definições erradas. Como você diz que não se baseia, não se preocupe. A menos que se baseie, mas ai você estaria comprovando meus argumentos. E mostrei as falácias e acho que você concorda comigo, senão não teria utilizado a palavra acusar. Essa é uma palavra forte, não acha? Eu não acusei, eu demonstrei logicamente; o que é bem diferente. O materialismo histórico marxista, por exemplo, é inteiro baseado na teoria objetiva e é absurdo do início ao fim, a história já mostrou isso tudo e os custos da aventura de engenharia social dos países socialistas. Abordei alguns dos absurdos da teoria e acho que nisso ambos concordamos, pelo menos foi a leitura que tive de seu comentário, pois você a todo momento fala que não se baseia na teoria objetiva. Leia novamente o início de minha argumentação de sua definição e tente encontrar outra conclusão senão a minha de que ela só faz sentido se você assumir a “transferência” de “renda” de uma propriedade para outra. As palavras renda e transferência reforçam minha conclusão, não estou sofismando – existe sim um nexo causal entre a sua definição e a teoria objetiva. Além disso, apenas para reforçar que não estou inventando nada, segue uma definição do Campos Filho (sua referência conceitual): “A questão da ‘mais valia urbana’ é muito importante porque é a especulação imobiliária. Quer dizer, se você não combate a especulação imobiliária, tem um problema de base na cidade, onde há imóveis, para alugar ou para comprar, e “terrenos cada vez mais caros”. É o que estamos assistindo. Os imóveis ficaram de 30% a 50% e até 100 % mais caros em algumas regiões. Ou seja, quem paga aluguel, acabará sendo pressionado pelo proprietário a pagar aluguel 30% ou 50% mais caro e até mesmo 100 % maior. O mesmo acontece com quem vai comprar um imóvel. É normal isso? Não é! Isso faz parte de um capitalismo predatório, é especulação imobiliária associada à financeira que nós temos que combater.” O Campos Filho é um marxista puro sangue, logo adepto da teoria objetiva de valor, e você usa a definição dele para o seu artigo. Em outro artigo seu, a sua definição é a mesma que eu dei: “especulação imobiliária é a retenção de imóveis (especialmente terrenos urbanos) com a única finalidade de esperar sua valorização para revendê-los com lucros”. Concordo plenamente, só que essa definição é incompatível com a definição deste seu artigo e com os comentários que você fez, em especial este: “Não nos interessa o conceito mais amplo, ou literal, do especulador como ‘aquele que investe e tem a expectativa de obter um valor maior’, para usar suas próprias palavras”. Aqui você se contradiz novamente. Porém, o maior problema ainda é a questão do valor do solo e é aqui que estou pegando. O Campos Filho, sua referência para esse artigo, fala que a especulação é a mais-valia, que é ela que faz o preço do solo subir e que esse valor é “transferido” para os lucros. Além disso, usar o termo capitalismo predatório é não entender nada de economia política. Só concordo com o combate da financeirização, mas por motivos opostos, pois a financeirização da economia acontece devido ao intervencionismo estatal na moeda e ele acha que é coisa de especulador pois é marxista. É importante estudar outras áreas de conhecimento porque muitas coisas que nos deparamos em nossas áreas já foram resolvidas e nós estamos nadando contra a corrente. E é por isso que se definem coisas, para que elas sejam um ponto inicial que embase uma argumentação. Se eu quisesse definir especulação como o ato de jogar água azul num balde verde e disso tirar conclusões, ninguém poderia dizer que estou errado segundo minha definição (quer dizer, até poderia e eu teria que rever minha posição). O fato é que a definição é outra e no caso de seu artigo as conclusões são equivocadas e as sugestões agem contra a situação que você quer melhorar. Note que o título de seu artigo é “o que é especulação imobiliária?”. Mas você fala pouco da definição e parte para as conclusões apressadamente. Você deveria se prender mais na definição, pois é seu assunto, e ir aos fundamentos dela, pois ela será o axioma de sua argumentação. Entender realmente definições e o aparato teórico em que elas estão inseridas é essencial para o desenvolvimento de um raciocínio. E como a sua definição não está correta, você conclui equívocos e sugere o que não vai dar certo, pois não leva em consideração a teoria subjetiva da moeda e do valor. Como você afirma que minha conclusão é possível, você teria que tê-la encontrado antes de definir para então rever a definição caso não concordasse com ela. Definições não podem ser relativistas, de acordo com a vontade de quem as usa. Elas devem ser inteligíveis e entendidas por quem lê, senão causam esses problemas que citei. No restante do artigo você fala dos problemas causados pela especulação. Aqueles não são problemas causados pela especulação, são causados pela inflação. Olha aqui outra palavra definida erroneamente por ai. A inflação é o ato de inflar: inflar a base monetária, imprimir dinheiro. Essa é a primeira definição de inflação. Depois começaram a medir um dos efeitos dela, a subida de preços e chamaram de índice de inflação. No final das contas inverteram a definição e agora inflação é vista como a subida de preços. E pior, a agência responsável pela inflação, o Banco Central, agora é vista como a responsável por não deixar que os preços aumentem. Mas é a existência do banco que faz os preços aumentarem e esse nem é o pior dos efeitos da inflação: os piores são a intensificação de ciclos econômicos (que aumenta a especulação), a concentração de renda e a espoliação dos mais pobres sob o aumento de preços. Nas cidades ela causa tudo o que você disse ali ser responsabilidade da especulação e aumenta a quantidade desta, o que é perigoso quando a realidade volta e quer que paguemos seus custos. Minha analogia do esquilo era exclusiva ao lema: comprar na baixa e vender na alta. O especulador, numa economia livre, frise-se, compra quando a demanda é baixa e estoca para quando a demanda for alta, como o esquilo. E ao fazer isso ele informa o mercado, utilizando o sistema de preços, para que outras pessoas invistam de forma a produzir valor e reduzir as oscilações de preços entre esses períodos de vacas gordas e magras, algo que o esquilo não faz, obviamente. Mas sua analogia com o cambista não foi feliz, desculpa; perderei um pouco de tempo aqui para mostrar que o cambista é sim um especulador, mas seu lucro (ou prejuízo) não vem da mesma forma da de um especulador imobiliário. Há um fato incômodo no mundo, existe escassez. E há duas formas de se lidar com ela, ou se deixa os preços tentarem equilibrar a oferta com a demanda, ou se utiliza outros mecanismos para o racionamento, como filas, sorteios, concursos, vestibulares etc. Nos casos em que o estado aumenta a escassez (ao inibir a concorrência privada) e se coloca como monopolista isso é bem visto, inclusive a existência de suborno, apadrinhamento, favorecimento etc. Acho que os países mais intervencionistas como Cuba ou Venezuela , são bons exemplos. O cambista existe porque existe fila e se há fila, é porque a demanda é muito maior que a oferta e não é o sistema de preços que corrige essa distorção – é a fila. A oferta também não é variável, como no caso dos imóveis, ela é inelástica. Ora! Se existe fila e existe cambista que lucra, não existe escassez artificial. Existem muito mais pessoas na fila que ingressos, logo é impossível a escassez ser artificial, ela é natural e o cambista é um empreendedor que percebe que muitas pessoas acabarão comprando dele ao contrário de entrarem na fila, mesmo pagando um preço maior. Se a fila fosse do tamanho do número de ingressos e existissem cambistas no meio, ai sim você poderia dizer que ele aumenta a escassez num primeiro momento, mas a demanda não é alta e o lucro será baixo também, o que inviabiliza a existência do cambista. É claro que ele tem que trabalhar, investir e especular. Ele tem que ficar na fila primeiro, comprar com sua poupança e depois torcer para que haja mesmo compradores, senão seus investimentos vão para o brejo. Seu lucro virá da valoração e dos recursos dos consumidores que esperam lucrar com essa transação. E, como no caso do especulador, ele comprou o ingresso como estoque para aqueles que chegaram atrasados (já aconteceu comigo) ou para aqueles que preferem pagar mais para não ficar na fila (serviço nem sempre disponível por teatros, shows, jogos etc.). Bem! Você pode até achar isso injusto, mas o fato é que ele não agrediu ninguém para fazer isso, ao contrário das ações do estado que se baseiam única e exclusivamente na agressão contra os direitos fundamentais. E você pode, numa próxima, ir mais cedo lá e ficar na fila para garantir seu ingresso e contabilizar isso como seu custo psicológico ou o custo de não estar em casa descansando, sei lá. As outras opções são ficar sem ingresso ou comprar do cambista, a escolha é sua e é livre. A inexistência do cambista não vai fazer a mágica de garantir ingressos para todo mundo que quiser; a realidade é dura mesmo. Já o especulador não ganha dinheiro no sistema de filas; ele ganha no sistema de preços e a oferta do bem não é inelástica e a existência do especulador e de outros empresários garante que não aconteça o que aconteceu com Moscou. A empiria não valida nenhuma teoria nas ciências sociais (em sistemas complexos que envolvem a ação humana, o tempo e a incerteza), ela no máximo ilustra uma teoria baseada na lógica, ou fornece hipóteses sem nenhuma forma objetiva de validação (certo e errado, apenas talvez e é relativo). Porém, acho que esses três artigos são interessantes pra começar: Sobre a praxeologia. Sugiro começar por esses agradáveis vídeos da praxgirl: http://www.youtube.com/watch?v=MoNU_-__LlQ Renato. Mais uma vez agradeço seus argumentos e peço desculpas caso tenha sido ríspido em algum momento. Até mais, Comments are closed. |