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Deste modo, se assume como alguém que sempre vai "ser gauche na vida". A palavra "gauche" vem da língua francesa e significa "esquerdo". A expressão parece ser uma metáfora para quem é estranho, diferente, anda ao contrário da maioria. Em sua obra de estreia, em tom confessional, o poeta declarou ser gauche, ou seja, torto, esquerdo, marginalizado. Sua declaração tornar-se-ia no decorrer do tempo sua personalidade estética, como assinalou o estudioso Affonso Romano de Sant'Anna. Carlos Drummond de Andrade Quando nasci, um anjo torto desses que vivem na sombra disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida. As casas espiam os homens que correm atrás de mulheres. A tarde talvez fosse azul, não houvesse tantos desejos. Quando eu nasci, um anjo torto desses que vivem na sombra disse: Vai, Carlos! Ser gauche na vida. As casas espiam os homens que correm atrás de mulheres. A tarde fosse azul, não houvesse tantos desejos. Ser gauche na vida é ser estranho, deslocado, diferente. Gauche é uma palavra francesa que significa esquerdo. Drummond a usou em uma de suas mais famosas obras, Poema das Sete Faces, que abaixo transcrevo. Ele se sentia desasjustado diante do mundo, numa visão pessimista de sua realidade. Significado de Gauche adjetivo Indivíduo tímido, incapaz, sem muita aptidão. Quando eu nasci, um anjo torto desses que vivem na sombra disse: Vai, Carlos! Ser gauche na vida. As casas espiam os homens que correm atrás de mulheres. A tarde fosse azul, não houvesse tantos desejos. "Quando nasci, um anjo torto desses que vivem na sombra disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.As casas espiam os homens que correm atrás de mulheres. A tarde talvez fosse azul,não houvesse tantos desejos. Adélia Prado Quando nasci um anjo esbelto, desses que tocam trombeta, anunciou: vai carregar bandeira. Cargo muito pesado pra mulher, esta espécie ainda envergonhada. Aceito os subterfúgios que me cabem, sem precisar mentir. Poema de sete faces (Poema da obra “Alguma poesia”), de Carlos Drummond de Andrade. ... No poema são apresentados tanto seu discurso quanto sua gênese, numa estrutura marcada pela ambivalência: a cada estrofe intercalam-se harmonia e desarmonia, ainda que a linguagem pretenda-se impessoal e casual. Ser “gauche” na vida. Carlos Drummond de Andrade. II. Quando nasci veio um anjo safado O chato dum querubim E decretou que eu tava predestinado A ser errado assim Já de saída a minha estrada entortou Mas vou até o fim. A função da linguagem predominante neste texto acima é: ... b) Poética, pois o mais importante certamente deste texto é a sua forma, com estrofe, versos e. rima. Quando eu nasci, um anjo torto desses que vivem na sombra disse: Vai, Carlos! Ser gauche na vida. As casas espiam os homens que correm atrás de mulheres. A tarde fosse azul, não houvesse tantos desejos.
Carlos Drummond de Andrade Quando nasci, um anjo torto desses que vivem na sombra disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida. As casas espiam os homens que correm atrás de mulheres. A tarde talvez fosse azul, não houvesse tantos desejos. O bonde passa cheio de pernas: pernas brancas pretas amarelas. Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração. Porém meus olhos não perguntam nada. O homem atrás do bigode é sério, simples e forte. Quase não conversa. Tem poucos, raros amigos o homem atrás dos óculos e do bigode. Meu Deus, por que me abandonaste se sabias que eu não era Deus, se sabias que eu era fraco. Mundo mundo vasto mundo se eu me chamasse Raimundo seria uma rima, não seria uma solução. Mundo mundo vasto mundo, mais vasto é meu coração. Eu não devia te dizer mas essa lua mas esse conhaque botam a gente comovido como o diabo.
Poema de Sete Faces é uma das composições mais populares de Carlos Drummond de Andrade. Publicado na obra Alguma poesia (1930), o poema versa sobre os sentimentos de inadequação e solidão do sujeito, temáticas frequentes na obra de Drummond. Podemos questionar: por que motivo os versos de Carlos Drummond de Andrade continuam sendo amados pelo público e se mantêm atuais com o passar das décadas? A resposta talvez esteja no tom sensível e intimista da sua poesia, capaz de explorar emoções e dores intemporais. Quer compreender melhor o Poema de Sete Faces? Acompanhe a nossa análise! Poema de Sete Faces
Escute o Poema de Sete Faces declamado pelo ator Paulo Autran: Análise do Poema de Sete FacesEstrofe 1
Na primeira estrofe, o sujeito começa por contar a sua história. Já a princípio, existe a ideia de que está predestinado, de que seu destino foi marcado por um "anjo torto" assim que nasceu. Deste modo, se assume como alguém que sempre vai "ser gauche na vida". A palavra "gauche" vem da língua francesa e significa "esquerdo". A expressão parece ser uma metáfora para quem é estranho, diferente, anda ao contrário da maioria. Nesta primeira instância, o sujeito também faz uma revelação muito importante: o seu nome é Carlos, como Drummond. Este fator permite uma identificação entre o autor e o eu-lírico, conferindo um cunho autobiográfico ao poema. Estrofe 2
A segunda estrofe começa com uma personificação: as casas, como se fossem pessoas, observam o movimento das ruas. Como se estivesse distanciado, apenas numa posição de observador, o sujeito descreve aquilo que está vendo. Referindo que os homens "correm atrás de mulheres", parece exemplificar a procura desesperada do amor, a solidão e também o desejo, que muda até a cor do céu. Precisamos lembrar que o próprio olhar do sujeito influencia aquilo que ele enxerga: há a possibilidade de estar projetando os seus sentimentos na paisagem urbana. Estrofe 3
Ainda numa posição de observador, como se estivesse sempre do lado de fora da ação, nesta estrofe a impressão de isolamento do sujeito aumenta. No bonde, quando fala que vê um monte de pernas, o eu-lírico está usando uma metonímia (recurso expressivo que toma a parte pelo todo). Aquilo que está sendo sublinhado é a ideia de que existem muitas pessoas nas ruas, uma multidão à sua volta. A existência de tanta gente ao seu redor, tanta gente no mundo, parece causar um sentimento de aflição no sujeito, que pergunta a Deus para quê. Estrofe 4
Subitamente, nesta quarta estrofe, o olhar do sujeito se volta para si mesmo. Se descrevendo como "sério, simples e forte", parece corresponder à imagem de resiliência que era esperada de um homem adulto. Contudo, nos versos seguintes, o sujeito mostra o que existe além dessa imagem exterior. É um indivíduo fechado, incomunicável e bastante solitário. No meio de tanta gente, naquela que parece ser uma cidade grande, é esmagadora a sensação de abandono que vai, gradualmente, tomando conta do eu-lírico. Estrofe 5
O crescendo de tristeza, solidão e desespero do sujeito atinge o seu pico na quinta estrofe do poema. Aqui, temos uma espécie de grito de socorro, de súplica a Deus. Trata-se de uma referência bíblica que parafraseia as palavras de Jesus Cristo quando está sendo crucificado. É evidente o seu sofrimento e também as sensações de desamparo e orfandade. Sem direção, sem apoio na terra nem no céu, este sujeito está sozinho no mundo. A passagem reforça a ideia de humanidade do eu-lírico: não é Deus, é apenas um homem, por isso é "fraco", vulnerável, falível. Estrofe 6
Refletindo sobre a imensidão do mundo, é notório que o sujeito se sente pequeno, insignificante perante todo o resto. Nesta estrofe, podemos encontrar uma reflexão sobre o próprio fazer poético. Ao afirmar que "seria uma rima, não seria uma solução", podemos depreender que o sujeito está declarando que escrever poesia não resolve os seus problemas com a vida. Mesmo assim, pode ser uma forma de acessar o seu eu mais profundo. Nos últimos versos desta passagem, ele afirma que o seu coração é ainda mais vasto, talvez porque sente demais ou guarda emoções e dores não exteriorizadas. Existe também a sugestão de que, além do planeta ser enorme e cheio de gente, há em cada pessoa um mundo interior, talvez infinito e desconhecido para os outros. Estrofe 7
Os últimos versos chegam como a confissão final do eu-lírico. Aqui, ele fala da noite como um tempo de reflexão, vigília e sensibilidade. A lua, o álcool e a própria poesia permitem que o sujeito, normalmente retraído, esteja em contato com as suas emoções. Tudo isso o comove e o leva a exprimir aquilo que realmente sente, através deste poema. Significado do Poema de Sete FacesEmocionante e complexo, o poema assume um tom confessional que é ampliado pela possível identificação do eu-lírico com Drummond. A temática de "eu versus o mundo", que atravessa a sua obra, está presente desde o primeiro verso da composição. Se declarando como alguém que nasceu para ser "gauche na vida", o sujeito se sente desenquadrado e procura o seu lugar no mundo. Assim, em várias instâncias, se comporta como um mero observador da realidade, como se não fizesse parte dela, estivesse do lado de fora. Composto por sete estrofes, o poema apresenta "sete faces" do eu-lírico. Cada estrofe exprime uma faceta do sujeito, ilustrando o que ele está sentindo naquele momento. Assim, o poema surge como um desabafo que demonstra a multiplicidade e até contradição de suas emoções e estados de espírito. Sobre Carlos Drummond de AndradeCarlos Drummond de Andrade (31 de outubro de 1902 — 17 de agosto de 1987) é considerado o maior poeta nacional do século XX. O seu nome está, sem dúvida, entre os mais marcantes e influentes do seu tempo e da literatura brasileira em geral. Fazendo parte da segunda fase do modernismo brasileiro, a sua obra assumiu traços característicos da época como o uso da linguagem corrente, a valorização do cotidiano e as temáticas sociopolíticas. Refletindo sobre questões intemporais como a solidão, a memória, a vida em sociedade e as relações humanas, seus versos superaram a passagem do tempo e continuam arrebatando leitores de todas as gerações. Conheça mais sobre a poética de Carlos Drummond de Andrade. Conheça também |