V Congresso Internacional de Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural Fórum da Maia, 25 a 27 de Outubro de 2007 AGIR – Associação para a Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural 269 http://www.agir.pt - – agir.associacao@gmail.com As Tecnologias da informação e Comunicação: globalização e exclusão Joaquim Escola Departamento de Educação e Psicologia da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (Portugal) Paula Flores Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (Portugal) Palavras-chave: globalização, tecnologias da informação e comunicação, inclusão. O acelerado desenvolvimento tecnocientífico na contemporaneidade, com especial relevo para as Tecnologias da Informação e Comunicação, rasga um horizonte de novas possibilidades, em muitos casos, não suficientemente avaliadas em relação às potencialidades efectivas que disponibilizam ou mesmo ao alcance e espectro da sua acção, bem como das suas possíveis consequências. Assumindo como modelo de leitura deste fenómeno o paradigma ecológico importa, à luz da história, questionar as relações entre as tecnologias da informação e comunicação e o fenómeno avassalador da globalização. A promessa de uma “aldeia global”, de uma magna cidade, a metropolis do século XXI, tem hodiernamente nas TIC, um ancoradouro, porto de abrigo das mais elevadas expectativas de edificação da megalopolis, carente de limites ou margens, albergando no seu seio todos. Contudo, os fenómenos de exclusão, mau grado os desejos e ensejos dos políticos ou economistas, continuam a pontuar o mapa mundi da civilização, deslaçando vastos territórios, destruindo pontes e insularizando comunidades inteiras. Nesta comunicação pretendemos pensar a relação entre o desenvolvimento das tecnologias da informação e comunicação os fenómenos conexos da globalização e da exclusão. L'accéléré développement technicien et scientifique dans le present, avec spécial relief pour les Technologies des Informations et de la Communication, déchire un horizon de nouvelles possibilités, dans de nombreux cas, non suffisamment évaluées concernant les potentialités effectives qui mettent ou même à la portée et au spectre de son action, ainsi que de leurs possibles conséquences. En faisant du paradigme écologique le modèle de lecture de ce phénomènee importe, à la lumière de l'histoire, interroger les relations entre les technologies des informations et la communication et le phénomène dominant de la globalisation. La promesse d'un "village global", d'une grande ville, à des metropolis du siècle XXI, a aujourd'hui, dans les TIC, un ancrage, port d'abri des plus élevées attentes de construction des megalopolis, exempt de limites ou de marges, logeant dans son sein tous le monde. Néanmoins, les phénomènes d'exclusion, malgré les désirs ardent des hommes politiques ou des économistes, en continuant à enregistrer des situations dans le mapa mundi de la civilisation, en délaçant de vastes territoires, détruisant ponts et en isolant des communautés entières. Dans cette communication nous prétendons penser la relation entre le développement des technologies des informations et la communication et les phénomènes connexes de la globalisation et de l'exclusion.
V Congresso Internacional de Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural Fórum da Maia, 25 a 27 de Outubro de 2007 AGIR – Associação para a Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural 270 http://www.agir.pt - – agir.associacao@gmail.com INTRODUÇÃO O acelerado desenvolvimento tecnocientífico na contemporaneidade, com especial relevo para as Tecnologias da Informação e Comunicação, rasga um horizonte de novas possibilidades, em muitos casos, não suficientemente avaliadas em relação às potencialidades efectivas que disponibilizam ou mesmo ao alcance e espectro da sua acção, bem como das suas possíveis consequências. Assumindo como modelo de leitura deste fenómeno o paradigma ecológico importa, à luz da história, questionar as relações entre as tecnologias da informação e comunicação e o fenómeno avassalador da globalização. A promessa de uma “aldeia global”, de uma magna cidade, a metropolis do século XXI, tem hodiernamente nas TIC, um ancoradouro, porto de abrigo das mais elevadas expectativas de edificação da megalopolis, carente de limites ou margens, albergando no seu seio todos. Contudo, os fenómenos de exclusão, mau grado os desejos e ensejos dos políticos ou economistas, continuam a pontuar o mapa mundi da civilização, deslaçando vastos territórios, destruindo pontes e insularizando comunidades inteiras. Nesta comunicação pretendemos pensar a relação entre o desenvolvimento das tecnologias da informação e comunicação os fenómenos conexos da globalização e da exclusão. AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO E A GLOBALIZAÇÃO A presença constante das tecnologias da informação e comunicação tende a impor-se como uma marca decisiva na construção da sociedade da informação e comunicação e, ao mesmo tempo, na emergência da sociedade do conhecimento. A história da técnica, como se pode verificar por uma leitura atenta da sua trajectória ao longo dos séculos, foi marcada por um crescente aumento de importância e uma significativa melhoria do seu estatuto que importaria evidenciar. O aparecimento desta não pode desvincular-se da afirmação do homem como ser de acção (homo faber) e, ao mesmo tempo, da sua
V Congresso Internacional de Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural Fórum da Maia, 25 a 27 de Outubro de 2007 AGIR – Associação para a Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural 271 http://www.agir.pt - – agir.associacao@gmail.com condição de ser racional, construtor que desencadeia uma acção com consciência, guiado por um saber. A fabricação de artefactos, para além de registar momentos fulgurantes da inventividade humana, assinala a sua capacidade de transcender as limitações inscritas na sua mais finita e frágil condição como (ex)istente. A ousadia, a coragem, a astúcia humana, imortalizadas nas palavras que Sófocles emprestou ao coro de Antígona, recordam-nos de que forma a acção humana, mesmo em confronto com as forças mais indómitas da natureza, acaba por as dobrar à sua passagem, dominado quase tudo que se lhe atravessa no caminho, animado pela vontade de poder, inebriado pela tocha incandescente que perscruta nas trevas do desconhecido o caminho de luz que abre e anuncia o futuro. Desde o princípio a τεχνη procurou responder às necessidades vitais com que o homem se debatia disponibilizando também respostas que saciassem as necessidades simbólicas, numa afirmação clara do desejo de transcendência. Apesar do espaço insubstituível que a τεχνη ocupava na manutenção das necessidades vitais viu- se sistematicamente arremessada para um lugar de menoridade, sempre que confrontada com a τεορια, aclamada desde a cultura grega clássica. A técnica moderna, intrinsecamente associada ao desenvolvimento científico, transformou-se gradualmente encaminhando-se para uma paulatina, mas crescente valorização, não só por desvelar constantes materializações do seu progresso, mas por assegurar as condições de validação da própria construção científica. O projecto da modernidade enlaçou de forma única as noções de progresso, técnica e ciência. O edifício da civilização e do progresso construi-se de modo constante escorado, a partir de então, na solidez do desenvolvimento técnico e científico. A revolução científica moderna inaugurava uma nova visão assente no reconhecimento do valor do universo técnico, cada vez mais convocado para celebrar as conquistas científicas, mapeando as possibilidades que se abriam na melhoria das condições de bem-estar humanas. O século XIX assiste à emergência de um conjunto significativo de inovações e invenções no domínio da comunicação, a tal ponto que mereceu o epíteto do Século da Revolução das Comunicações, fundeando no mar desconhecido as promessas mais fortes de uma civilização da comunicação, cenáculo de todos os encontros e
V Congresso Internacional de Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural Fórum da Maia, 25 a 27 de Outubro de 2007 AGIR – Associação para a Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural 272 http://www.agir.pt - – agir.associacao@gmail.com desencontros. O século XX, pelo desenvolvimento da Cibernética num primeiro momento, da tecnologia informática e da inteligência artificial num segundo momento, contribuiu para a consolidação das condições mais adequadas à expansão de uma civilização progressivamente mais firmada na tecnologia. A leitura linear da história da ciência e da técnica não responde de forma cabal ao que pode motivar, legitimar e explicar as transformações culturais, sociais ou educacionais. Sem se pretender assumir a tese do determinismo tecnológico importa, apesar de tudo, não esquecer que a evolução da técnica e da tecnologia deverá conservar sempre a ideia de que a criação no universo tecnológico não se reveste de um carácter meramente cumulativo, promove transformações significativas na civilização. A vigilância crítica em relação às possibilidades iniciadas por cada invenção, e que têm no diálogo platónico Fedro um espaço nuclear pelas indicações de uma inquestionável actualidade que aí são disponibilizadas, abre-se como necessidade e exigência na contemporaneidade. No célebre diálogo onde se narra a invenção da escrita, Platão põe em confronto as perspectivas de Tamos, rei do Egipto e do deus Theuth, conhecido pela descoberta da “ciência do número e do cálculo, a geometria e a astronomia, o jogo de damas e o dos dados e sobretudo da escrita.” (Platão, 97:274d). O texto platónico conserva a intuição fundamental de que o inventor não é, seguramente, o melhor juiz da sua própria obra e, simultaneamente, recorda que a intencionalidade que preside à criação poderá desvanecer-se e desencadear consequências exactamente contrárias às que estiveram na génese. Escrevia Platão no Fedro (274e – 275b) : “Quando, porém, chegou a ocasião da escrita, Theuth comentou: ‘este é um ramo do conhecimento, ó rei, que tornará os Egípcios mais sábios e de melhor memória. Está pois descoberto o remédio da memória e da sabedoria.’ Ao que o rei responde: ‘Engenhíssimo Theuth, um homem é capaz de criar os fundamentos de uma arte, mas outro deve julgar que parte de dano e de utilidade possui para quantos dela vão fazer uso. Ora tu, neste momento, como pai da escrita que és, por lhe quereres bem, apontas-lhes efeitos contrários àqueles que ela manifesta. É que essa descoberta provocará nas almas o esquecimento de quanto se aprende, devido à falta de exercício da memória, porque confiados na escrita, é do exterior, por meio de sinais estranhos, e não de dentro, graças a esforço próprio, que obterão as recordações. Por conseguinte, não descobriste um remédio para a memória, mas para a recordação. Aos estudiosos oferece a aparência da sabedoria e não da verdade, já que, recebendo, graças a ti, grande quantidade de conhecimentos, sem necessidade de instrução, considerar-se-ão muito sabedores, quando são ignorantes na sua maior parte e, além disso, de trato difícil, por terem a aparência de sábios e não o serem verdadeiramente”.
V Congresso Internacional de Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural Fórum da Maia, 25 a 27 de Outubro de 2007 AGIR – Associação para a Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural 273 http://www.agir.pt - – agir.associacao@gmail.com John Condry (1995:33) na obra escrita em parceria com Karl Popper Televisão: um Perigo para a Democracia, reflectindo sobre a questão das transformações que ocorrem no mundo natural e no mundo social defendeu que “A evolução biológica progride lentamente, privilegiando ao longo dos séculos e dos milénios determinadas mutações em detrimento de outras. A evolução social, por sua vez, é completamente diferente: estimulada pelas descobertas e pelas e pelas invenções, é muitas vezes rápida e imprevisível. Algumas invenções limitam-se a provocar alterações ligeiras, geralmente boas, por vezes más, como a pólvora, por exemplo. Porém, outras, modificam a cultura e a sociedade de uma maneira profunda e imprevisível, e essas só retrospectivamente podem ser compreendidas.” Neil Postman (1994:23-24) na obra Tecnopolia. Quando a Cultura se Rende à Tecnologia, na mesma linha interpretativa, reconhece as significativas transformações provocadas pela presença de novos dispositivos tecnológicos, propondo-nos como chave de leitura para o universo mediático uma perspectiva ecológica: “ ... a competição tecnológica desencadeia a guerra total, o que significa que não é possível conter os efeitos de uma nova tecnologia numa esfera limitada de actividade humana. Se esta metáfora apresenta a questão com demasiada brutalidade, podemos tentar ser um pouco mais gentis e suaves: a mudança tecnológica não é aditiva nem subtractiva, é ecológica. Utilizo ‘ecológica’ no mesmo sentido em que a palavra é utilizada pelos cientistas ambientalistas. Uma mudança significativa gera mudança total. Se removermos as lagartas de um determinado habitat, não ficamos com o mesmo ambiente menos as lagartas: temos um novo ambiente e reconstituímos as condições de sobrevivência; o mesmo é verdade se introduzirmos as lagartas num meio ambiente em que não existiam. É assim também que funciona a ecologia dos media. Uma nova tecnologia não acrescenta nem subtrai nada, altera tudo.” Em tempos de mudança e transformação a grande questão que urge formular é a que interroga as novidades que as tecnologias da informação e comunicação trazem ao panorama mediático? Ao mesmo tempo, sem pretender fazer futurologia, procurar avaliar as necessárias transformações que acolitam as inovações tecnológicas. Há um conjunto de dimensões que estão associados às tecnologias da informação e comunicação. A primeira constatação radica na centralidade da informação nas sociedades contemporâneas e, simultaneamente, na importância estruturante desta em todos os sectores da sociedade. Se no longo trajecto da história da comunicação verificamos a
V Congresso Internacional de Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural Fórum da Maia, 25 a 27 de Outubro de 2007 AGIR – Associação para a Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural 274 http://www.agir.pt - – agir.associacao@gmail.com permanência de um desejo de transgressão das limitações espacio-temporais, (Cloutier, 2002) as tecnologias da informação e comunicação vieram facilitar o acesso a todas as formas de informação, independentemente de se encontrarem num formato textual, icónico ou sonoro e, ao mesmo tempo, permitir o armazenamento de grandes quantidades de informação em suportes cada vez menores. 1 Disquetes, CD-ROM e DVD enquanto suportes podem conservar quantidades muito diferentes de informação e atestam este esforço constante para conservar cada vez mais informação. O desenvolvimento dos sistemas informáticos (computadores, periféricos e programas) tem permitido uma melhoria significativa, em termos de rapidez e fiabilidade, nas tarefas de processamento de dados. Os canais de comunicação que a sociedade da informação tem hoje à sua disposição ampliaram desmesuradamente as possibilidades de acesso à informação, convertendo o que seria a grande virtualidade, condições excepcionais no acesso à massa informativa, no grande problema, pois o excesso de informação, converte-se numa dificuldade extraordinária. Contudo, a informação assume um lugar incontornável na economia das nações. O acesso à informação, a rapidez com que se concretiza a permuta da informação, a transformação daquela em conhecimento e em riqueza assinala o fosso entre as economias avançadas, pós-industriais e as economias industriais ou pré- industriais. A informação converte-se em poder. As tecnologias da informação e comunicação, potenciadas pelo desenvolvimento e progresso acelerado da engenharia informática, criam as condições mais adequadas a esta conversão da informação em fonte de poder. Numa economia liberal a concorrência impõe-se como condição estruturante do normal funcionamento da economia num mundo globalizado. As oportunidades de investimento, a criação de empresas, o lançamento de novos produtos, a exploração de nichos de mercado ou a entrada em mercados globais nutrem-se do valor da informação. 1 A disquete pode conservar em 1,4Mbytes o equivalente a um livro com umas centenas de páginas, um CD-ROM com 600 Mbytes pode conservar uma qualquer enciclopédia e, por fim um DVD, equivalente a 20 CD-ROM pode guardar uma longa metragem em boa qualidade.
V Congresso Internacional de Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural Fórum da Maia, 25 a 27 de Outubro de 2007 AGIR – Associação para a Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural 275 http://www.agir.pt - – agir.associacao@gmail.com GLOBALIZAÇÃO: INCLUSÃO OU EXCLUSÃO As grandes promessas que envolveram o desenvolvimento das TIC (a informática, as telecomunicações e as tecnologias do som e imagem) foram também um local de concretização de algumas das mais elevadas aspirações da humanidade. As suas realizações permitiram conquistar uma posição essencial na compreensão da organização das dimensões económica, política, social, cultural e educacional. A este propósito Joan Majó e Pere Marquès (2001:35) escreveram: “Cambiantes, seguindo o ritmo dos contínuos avanços científicos e no marco da globalização económica e cultural, as TIC contribuem para a rápida obsolescência dos conhecimentos e a emergência de novos valores, provocando contínuas transformações em nossas estruturas económicas, sociais e culturais, e incidindo em quase todos os aspectos da nossa vida: o acesso ao mercado de trabalho, a saúde, a gestão burocrática, a gestão económica, o desenho industrial e artístico, o ócio, a comunicação, a informação, a maneira de perceber a realidade e de pensar, a organização das empresas e instituições, os seus métodos e actividades, a forma de comunicação interpessoal, a qualidade de vida, a educação...” As oportunidades rasgadas pela digitalização da informação, conversão em código numérico de letras, signos textuais, imagens, sons, assinalam a entrada num mundo radicalmente novo. As TIC melhoraram significativamente a capacidade de processamento de dados independentemente de se tratarem de textos, imagens, números. A fiabilidade e rapidez com se organiza, transforma e permuta a informação assinalam uma das conquistas mais significativas da engenharia informática. O horizonte comunicacional transfigurou-se absolutamente, abrindo caminho à emergência de canais de comunicação imediata, síncrona e assíncrona, difundindo através das auto-estradas da informação dados que atinjam os pontos mais distantes do globo, permitindo que qualquer pessoa aceda à informação que circula na web, troque mensagens por intermédio do correio electrónico ou discuta entusiasticamente em fóruns ou chats. Se aclamámos em momentos diferenciados da história algumas inovações, reconhecendo-lhe a dimensão revolucionária de que se revestiram, cabe-nos, na esteira
V Congresso Internacional de Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural Fórum da Maia, 25 a 27 de Outubro de 2007 AGIR – Associação para a Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural 276 http://www.agir.pt - – agir.associacao@gmail.com de Manuel Castells (2004) anunciar a entrada numa nova galáxia comunicacional: a galáxia internet. Se MacLuhan sublinhando a importância das revoluções da imprensa e electrónica consagrou a galáxia Gutenberg e a Galáxia Marconi o século XXI, (Castells, 2002: 434) caminha a passos largos para a confirmação desta nova revolução, que conserva o mesmo sentido e persegue o mesmo objectivo que encontramos esboçado no primeiro momento da aventura comunicacional humana, que na aurora da civilização ousou levar sempre mais longe as mensagens estreitando o mundo e perpetuando no friso cronológico as mensagens. A internet garante esta nova comunicação à distância dispensando, em inúmeras circunstâncias, a presença dos interlocutores alargando, apesar de tudo, o número de possibilidades de realização de outras acções impensáveis sem aquela. No entanto existe sempre o outro lado da inovação tecnológica, há sempre um preço a pagar. Quando na década de 80 o pensador norte-americano da comunicação Neil Postman (1991), no livro Amusing Ourselves to Death. Public Discourse in Age of Show Business procurava identificar as cidades que em algum momento da sua história encarnaram o espírito americano e os símbolos a si associados, constatou que a época em que escrevia tinha na cidade de Los Angeles a grande metáfora do espírito americano e os seus símbolos eram uma slot machine e um reclame luminoso de grandes dimensões com uma bailarina de cabaret. (Postman,1985: 7-8) A era do espectáculo anunciava-se assim na magna sala de espectáculo do mundo, a cidade do entretenimento, sendo cada ludopolita convidado a mergulhar sem assombro, nem espanto no agitado jogo da metropolis cada vez mais convertida em ludopolis. As novas tecnologias que se haviam insinuado na génese da cosmopolis como dispositivos poderosos no armazenamento, organização e tratamento de informação, assumem também a instante tarefa de animarem, e perpetuarem o frenesim do mundo do espectáculo, obscurecendo na imensa pantalha da sociedade da informação o rosto daqueles que se vão convertendo em meros espectros do patético teatro de sombras que entra diariamente pelas salas de jantar de cada cidadão da telepolis mas não sem nos recordar o peso do silêncio em face da miséria e da exclusão.
V Congresso Internacional de Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural Fórum da Maia, 25 a 27 de Outubro de 2007 AGIR – Associação para a Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural 277 http://www.agir.pt - – agir.associacao@gmail.com A consciência de que os fenómenos de pobreza e exclusão continuam a emergir não só no continente africano mas também nas sociedades consideradas mais desenvolvidas, põe a descoberto o absurdo de um modelo de desenvolvimento que se nutre do sangue e sacrifício dos outros como condição essencial para a sua própria prosperidade. Se assistimos aos longo dos séculos a um esforço contínuo para a humanização da humanidade, apagando no curso da história algumas das manifestações mais inumanas, o desafio do século XXI passa pela capacidade de criar condições para que na cidade- mundo, na omnipolis, se apaguem definitivamente todos os fenómenos de exclusão deliberada, de violência física e simbólica, de pobreza, num reconhecimento de uma alteridade diversa. Se nessa diligência se buscou ultrapassar os preconceitos de raça, condição económica, orientação sexual ou credo religioso alargando os territórios de comunhão e comunicação na diversidade e diferença, tantas vezes nimbados pelo sonho de uma sociedade adjuvada pelo desenvolvimento tecnocientífico, rapidamente descobrimos que a par dos seculares ou mais recentes combates pela dignidade humana, a globalização impunha uma redobrada atenção à emergência de novas formas de exclusão. A sociedade do conhecimento encontra-se estruturalmente enraizada no universo tecnocientífico desvelando uma impotência perante a agonia dos países grandemente arredados da marcha acelerada do progresso tecnológico. A fractura digital desvela as fragilidades de um crescimento económico desigual das nações. A inclusão digital apresenta-se, hodiernamente, como um dos desafios mais importantes da sociedade do conhecimento. Se a utopia de uma sociedade da informação e comunicação aparece como promessa e se enraíza no imaginário social, cultural e comunicacional, as fragilidades económicas de alguns países em vários continentes comprometem-na. As desigualdades assinalam aqueles que vêem ser acrescentada à sua pobreza, analfabetismo e manifestações de marginalização a infoexclusão, deixando crescer o ódio e a revolta, enquanto assistem do outro lado do abismo à exuberância dos festins nos oceanos de abundância em que os países desenvolvidos se banqueteiam. O progresso tecnológico, em particular no domínio das TIC, acelerou o tempo, impondo a todos os cidadãos a exigência de uma formação constante, a actualização permanente,
V Congresso Internacional de Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural Fórum da Maia, 25 a 27 de Outubro de 2007 AGIR – Associação para a Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural 278 http://www.agir.pt - – agir.associacao@gmail.com uma aprendizagem ao longo da vida que possibilite uma mobilização constante de saber e saber-fazer como resposta adequada à complexidade e às mutações do tempo. A ampliação das possibilidades empresariais e laborais, obtidas pelo desenvolvimento da internet, no domínio do trabalho à distância e à criação de empresas, ao não ter necessidade de manter num mesmo espaço e em interacção presencial os funcionários destas empresas, cria novas relações laborais e em muitas situações não consegue obstaculizar renovadas formas de exploração. O aumento exponencial da informação tem como consequência directa a impossibilidade de tratar e seleccionar em tempo útil a massa de informativa. O excesso pode paralisar conduzindo-nos à situação inversa a situação de informação. A possibilidade que os meios de comunicação de massa nos proporcionam de acedermos a informação em tempo real de acontecimentos ocorridos em pontos razoavelmente longínquos do globo continuam a mostrar-nos perspectivas de acontecimentos, pontos de vista que não descartam completamente a intenção de manipular ou enganar. CONCLUSÃO A evolução tecnocientífica disponibiliza cada vez mais possibilidades, sendo grandemente responsável pela consubstanciação do fenómeno da globalização. As tecnologias da informação e da comunicação, fruto das características, abrem novas oportunidades e contextos de intervenção pelo que vários sectores da sociedade são convidados a reflectir sobre as mudanças que paulatinamente se vão desenhando. Assim, pensar a relação entre o progresso das tecnologias da informação e comunicação e a globalização significa encontrar no espaço movediço destas rápidas transformações.
V Congresso Internacional de Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural Fórum da Maia, 25 a 27 de Outubro de 2007 AGIR – Associação para a Investigação e Desenvolvimento Sócio-cultural 279 http://www.agir.pt - – agir.associacao@gmail.com BIBLIOGRAFIA Castells, Manuel (2004) A Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura. vol. I (A Sociedade em Rede ). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. Castells, Manuel (2004) A Galáxia Internet. Reflexões sobre Internet, Negócios e Sociedade. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. Majó, Joan & Marquès, Pere (2001) La Revolución Educativa en la Era Internet. Barcelona: CissPraxis. Platão (1997) Fedro, Lisboa: Edições 70. Popper, Karl & Condry, John (1995) Televisão: Um perigo para a democracia. Lisboa: Gradiva Postman, Neil (1991) Divertirse hasta morir. El discurso público en la era del “show business”. Barcelona: Ediciones de la Tempestad. Postman, Neil (1994) Tecnopolia. Quando a Cultura se rende à tecnologia. Lisboa: Difusão Cultural. |