Compare algumas das coisas que cabem e que não cabe no poema de acordo com o poema não há vagas

                               Ferreira Gullar

O preço do feijão não cabe no poema. O preço O preço do arroz não cabe no poema. Não cabem no poema o gás a luz o telefone a sonegação

do leite 

da carne do açúcar do pão O funcionário público não cabe no poema com seu salário de fome sua vida fechada em arquivos. Como não cabe no poema o operário que esmerila seu dia de aço e carvão nas oficinas escuras - porque o poema, senhores, está fechado: "não há vagas" Só cabe no poema o homem sem estômago a mulher de nuvens a fruta sem preço O poema, senhores, não fede nem cheira

                              Ferreira Gullar, in 'Antologia Poética' 

Entendendo o poema:


01 – Onde é comum encontrar a expressão “não há vagas”, que dá nome ao poema?

      Expressão típica do mundo do emprego, das relações patrão e empregado, indica falta de oportunidade.

02 – Que imagem esse título ajuda a construir no poema?

      À falta de oportunidades no mercado de trabalho.

03 – Como você interpretaria no poema a expressão “o homem sem estômago”?

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Aquele, remediado ou rico, cujas preocupações não se voltam para as questões básicas de subsistência.

04 – Que artigos de primeira necessidade aparecem na primeira estrofe?

      Os itens: feijão, arroz, gás, luz, telefone, leite, carne, açúcar e pão.  

05 – De acordo com o contexto do poema, qual o significado de sonegar?

      Pressupõe furtar, fraudar, desviar.

06 – Na segunda estrofe são destacados dois sujeitos que também não cabem no poema. Quem? Por quê?

      O funcionário público e o operário. O primeiro, com seu “salário de fome” tem a “vida fechada / em arquivos”. O operário por sua vez, ao esmerilar o seu “dia de aço” nas “oficinas escuras”.

07 – O que o poeta quis dizer com:

·        “Mulher de nuvens”?

      A mulher idealizada, objeto de abstração. 

·        “Fruta sem preço”?

Aquela apenas admirada nas formas, se exposta na obra de arte, e não aquela comprada nos tablados da feira.

08 – Na última estrofe: “O poema, senhores, 

                                       não fede 

                                       nem cheira.”

O que o poeta afirma?

      Afirma que o poema apenas idealiza a vida – tanto faz existir ou não, é indiferente.

09 – Quem é o autor do poema?

      Ferreira Gullar.

10 – Como o poeta se refere aos operários da fábrica?

      Como não cabe no poema o operário que esmerila seu dia de aço e carvão nas oficinas escuras.

11 – Você concorda com as ideias do poeta? Explique sua resposta.

      Resposta pessoal do aluno.

12 – Em sua opinião, o que o autor quis dizer com a expressão “Não há vagas”?

      Resposta pessoal do aluno.

13 – Você conhece pessoas que exercem atividades citadas no poema?

      Resposta pessoal do aluno.

14 – Sobre o poema Não há vagas, de Ferreira Gullar, é correto afirmar:

a) Ao ser aproximada de um ato lúdico como o fazer poesia, a crítica social é atenuada e perde força.

b) A ruptura com o verso tradicional situa o poema no contexto da primeira geração modernista.

c) Nota-se uma conjunção entre a reflexão sobre o fazer poético e a preocupação com a realidade social adversa.

d) A crítica política e a reflexão sobre a literatura presentes no poema configuram exceção na produção poética de Ferreira Gullar.

e) Trata-se de texto poético que destoa do conjunto da obra Toda poesia por utilizar redondilhas maiores e menores. 

15 – Sobre a obra de Ferreira Gullar estão corretas as seguintes proposições:

I. Uma das principais características da obra de Ferreira Gullar é a reflexão sobre a criação artística. Para o poeta, a poesia é fruto de um trabalho árduo, racional, que implica fazer e desfazer o texto até que ele alcance a sua forma mais adequada.

II. Ferreira Gullar integrou o grupo de poetas religiosos que se formou no Rio de Janeiro entre as décadas de 1930 e 40. Sua poesia é dividida em duas fases: a fase transcendental e a fase material.

III. A poesia de Ferreira Gullar destaca-se pelo engajamento político. Essa produção poética engajada ganhou força a partir dos anos de 1960, quando o poeta rompeu com a poesia de vanguarda, aderindo ao Centro Popular de Cultura (CPC).

IV. Explorando propriedades gráficas e vocais das palavras, rompendo com a ortografia e com as convenções da lírica tradicional, Ferreira Gullar integrou de maneira circunstancial o movimento concretista, do qual se afastou em virtude de discordâncias em relação às suas propostas teóricas.

V. Propôs um corte profundo entre a poesia romântica e a poesia moderna, criando um novo conceito de poesia ao dessacralizar a chamada “poesia profunda”, ou seja, a poesia em que predominam os versos de sentimentos ou de abordagem introspectiva.

 Sua poesia é anti-lírica, presa ao real e direcionada ao intelecto, não às emoções.

a) I, II e V estão corretas.

b) III e IV estão corretas.

c) III e V estão corretas.

d) I e IV estão corretas.

e) II, III e IV estão corretas.

16 – O poema de Ferreira Gullar tem um tom de polêmica. A quem se dirige a voz que fala no poema? Justifique sua resposta com elementos do texto.

      A voz que fala no poema aparentemente se dirige a uma plateia, como se percebe pelo vocativo “senhores” da terceira e da última estrofes.

17 – Que tipo de linguagem o autor imita com o tom eloquente do poema?

      Ele imita a linguagem dos discursos de protestos políticos.

18 – Como você classificaria o poema de Gullar?

      O poema de Gullar faz parte da literatura engajada.

19 – Segundo Gullar, o que não cabe no poema?

      A dura realidade em que vive a maioria das pessoas não cabe no poema.




Compare algumas das coisas que cabem e que não cabe no poema de acordo com o poema não há vagas

Você vai ler, a seguir, dois poemas de Ferreira Gullar. O primeiro foi produzido em 1963 e integra a obra Dentro da noite veloz; o segundo faz parte da obra Muitas vozes, publicada em 1999.

Texto 1 - Não há vagas

O preço do feijão

não cabe no poema. O preço

do arroz

não cabe no poema.

Não cabem no poema o gás

a luz o telefone

a sonegação

do leite

da carne

do açúcar

do pão

O funcionário público

não cabe no poema

com seu salário de fome

sua vida fechada

em arquivos.

Como não cabe no poema

o operário

que esmerila seu dia de aço

e carvão

nas oficinas escuras

- porque o poema, senhores,

está fechado:

"não há vagas"

Só cabe no poema

o homem sem estômago

a mulher de nuvens

a fruta sem preço

O poema, senhores,

não fede

nem cheira

Texto 2 - Não coisa

O que o poeta quer dizer

no discurso não cabe

e se o diz é pra saber

o que ainda não sabe.

Uma fruta uma flor

um odor que relume...

Como dizer o sabor,

seu clarão seu perfume?

Como enfim traduzir

na lógica do ouvido

o que na coisa é coisa

e que não tem sentido?

A linguagem dispõe

de conceitos, de nomes

mas o gosto da fruta

só o sabes se a comes

só o sabes no corpo

o sabor que assimilas

e que na boca é festa

de saliva e papilas

invadindo-te inteiro

tal dum mar o marulho

e que a fala submerge

e reduz a um barulho,

um tumulto de vozes

de gozos, de espasmos,

vertiginoso e pleno

como são os orgasmos

No entanto, o poeta

desafia o impossível

e tenta no poema

dizer o indizível:

subverte a sintaxe

implode a fala, ousa

incutir na linguagem

densidade de coisa

sem permitir, porém,

que perca a transparência

já que a coisa é fechada

à humana consciência.

O que o poeta faz

mais do que mencioná-la

é torná-la aparência

pura - e iluminá-la.

Toda coisa tem peso:

uma noite em seu centro.

O poema é uma coisa

que não tem nada dentro,

a não ser o ressoar

de uma imprecisa voz

que não quer se apagar

- essa voz somos nós.

1. O poema "Não há vagas" é organizado em duas partes.

a. Identifique os versos que pertencem a cada uma das partes.

b. De que trata cada uma dessas partes?

2. Compare algumas das coisas que cabem e que não cabem no poema, de acordo com o poema "Não há vagas":

CABEM                                  NÃO CABEM

arroz                                     homem sem estômago

feijão                                       mulher de nuvens

luz                                            fruta sem preço

telefone                                      

operário

a. De que tipo são as coisas que não cabem no poema?

b. De que tipo são as coisas que cabem no poema?

c. A oposição entre o que cabe e o que não cabe no poema revela duas concepções diferentes sobre o fazer poético. Quais são elas?

d. O eu lírico se mostra favorável a uma delas? Se sim, qual? Justifique sua resposta.

3. O poema "Não coisa" também aborda o tema do fazer poético. Releia estes versos:

A linguagem dispõe

de conceitos, de nomes

mas o gosto da fruta

só o sabes se a comes

a. Como o eu lírico vê a relação entre linguagem e objeto? Explique, utilizando elementos do poema.

b. Justifique o título do poema.

c. Diante do desafio, o poeta desiste? Justifique sua resposta com elementos do poema.

d. O que o poeta consegue fazer em relação ao objeto? Explique em que consiste sua ação.

4. Releia os últimos versos do poema "Não objeto":

O poema é uma coisa

que não tem nada dentro,

a não ser o ressoar

de uma imprecisa voz

que não quer se apagar

- essa voz somos nós.

a. O que há no poema?

b. Interprete o último verso do poema: "- essa voz somos nós".

5. O poema "Não coisa" foi escrito quase 40 anos depois do poema "Não há vagas", e ambos abordam o tema da criação poética.

a. Que diferença há na abordagem dos dois textos em relação a esse tema?

b. Que ideia sobre a criação poética está presente nos dois poemas?


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