Comparação poder de compra salario minimo

O salário-mínimo nacional chega ao final desta década, e ao começo da nova, com a pior proporção em relação ao custo da cesta básica nacional em dez anos. O valor, que passará de R$ 1.045,00 para R$ 1.100,00 em 1 de janeiro de 2021, tem o poder de compra de cerca de 1,58 cestas básicas, estimada em R$ 696,70, em média, pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).

Entre 2010 e 2019 esse indicador ficou sempre acima de duas cestas, com exceção de 2016, quando ficou em 1,93. Os anos de 2020 e 2021, no entanto, marcam uma guinada para baixo neste poder de compra. Dizer que o salário-mínimo vai aumentar não é uma realidade precisa. Apenas será corrigido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), estimado para fechar o ano em 5,26% e válido desde sexta-feira (1). Até o final de dezembro, o governo previa o reajuste em 4,1% (corrigindo o salário de referência para R$ 1.088). O índice foi revisto para cima na semana passada – mas ainda assim muito aquém da alta na chamada inflação dos alimentos.

Em economia se costuma relativizar quantias em “aumento real” e “aumento nominal”. Portanto, mudar de R$ 1.045,00 para R$ 1.100,00 implica em aumento nominal de R$ 55,00. Os R$ 55,00 extras, que passaram a valer em 2021, podem hoje comprar pouco mais de 2 quilos de carne moída de segunda, em Porto Alegre, de acordo com dados do Iepe/Ufrgs. Na comparação com o custo da comida nos últimos 12 meses, a perda de poder de compra do novo salário-mínimo de 2021 é relevante, já que a inflação dos alimentos beira os 20% no ano e o reajuste no valor de referência pouco mais de 5%.

Ou seja, a inflação que vai à mesa abocanha toda a correção do “mínimo” e mais um tanto. Assim, para quem mais necessita – o trabalhador de menor renda – dizer que o salário-mínimo vai aumentar é apenas simbólico. Na verdade, o poder de compra encolheu, e não foi pouco.

“Nesta década, a última recomposição relevante do salário-mínimo ocorreu até janeiro de 2015. A partir daí temos somente a manutenção do patamar e, nos dois últimos anos, um decréscimo significativo do poder de compra”, alerta Lúcia Garcia, economista do Dieese, comparando dados de reajuste nominal e dos índices do INPC no período.

Nesta comparação, o ápice do ganho real no salário-mínimo na década ocorreu em 2012, quando o valor passou de R$ 545,00 em 2011 para R$ 622,00 em janeiro de 2012, R$ 77,00 a mais. A alta nominal foi de 14,13% ante um INPC de 6,08%, o que corresponde a um aumento real de 7,59%. Isso porque entre 2011 e 2019 o reajuste incluía, além do INPC, o incremento do PIB de dois anos antes. Era uma forma de repassar ao salário-mínimo o percentual equivalente ao aumento da riqueza nacional, além da recomposição inflacionária. Nos dois últimos anos, a conta foi apenas pelo INPC.

ssalariados costumam usar a maior parte dos recursos com comida e têm a renda corroída pela inflação. Foto: Mauro Pimentel/AFP/JC

Economista do Ibre/FGV, André Braz alerta para o fato de que os alimentos pesam significativamente mais no bolso dos mais pobres, já que é basicamente para onde destinam a maior pare dos rendimentos. E por isso um aumento de apenas cerca de 5% no salário-mínimo ante a alta média de 20% é, na verdade, uma corrosão na quantidade de comida que se poderá colocar na mesa da família.

Braz diz que o aumento real no valor de referência na primeira metade desta década promoveu uma distribuição mais equilibrada das riquezas nacionais, reduziu desigualdades e melhorou a qualidade de vida de muita gente. Mas avalia que, por afetar as contas públicas e a Previdência, não era uma forma que se sustentaria por muito tempo.

“A correção pela inflação penaliza a população de baixíssima renda. Quanto menos se ganha, mais se gasta com comida, que aumentou muito acima dos índices médios de inflação. Mas o ganho real praticado na primeira década afetava as contas públicas e a previdência, que já estavam estranguladas”, diz Braz.

O economista ressalta, porém, que corrigir apenas pelo INPC, especialmente neste ano, em que a inflação dos alimentos já alcançou 18,5%, pelos cálculos do Ibre, amplia as desigualdades brasileiras.

“Isso afeta os mais vulneráveis e prejudicados pela pandemia e pelo desemprego. Mas não vejo uma fórmula ideal de correção como regra. Deveríamos, sim, estimular a educação de forma constante, para que as pessoas pudessem ter condições de produzir mais e melhor e aumentar sua própria renda sem depender tanto de reajustes do mínimo”, resume Braz.

Mário de Lima, coordenador da comissão de políticas públicas do Conselho Regional de Economia (Corecon/RS), é crítico do modelo de aumentos reais adotados na primeira metade desta década. Ele classifica como “populismo econômico” o que foi feito se comparado aos danos às contas públicas e da Previdência. Lima também avalia que não há um modelo ideal para o cálculo de reajusta do salário-mínimo e que, atualmente, a maior preocupação é gerar empregos. Assim, mais pessoas teriam ao menos o salário-mínimo depositado mensalmente na conta bancária.

“O grande foco deve ser aumentar a produtividade nacional, não apenas do trabalhador, mas das empresas e dos empresários também. Mais empregos é o que traz justiça social, em um País socialmente injusto há muito tempo. Não se resolve apenas com uma lei impondo um valor maior sem que o Estado tenha como arcar com isso também”, opina Lima.

Lúcia Garcia, do Dieese, porém, defende que o impacto nas contas da Previdência é justamente para quem mais precisa. E que os valores que respingariam na economia com um salário maior, por meio do consumo e posteriormente em tributos, compensariam a elevação. A economista argumenta ainda que o percentual de servidores públicos que ganham menos do que o salário-mínimo é muito baixo, e por isso o argumento de peso na folha de pagamento dos servidores é reduzido.

“Menos de 5% na folha do Estado fica abaixo do mínimo, e na esfera federal não influencia em nada. Na Previdência, impactaria positivamente para quem mais precisa. O aumento do salário-mínimo é compensando pela efetividade dos ganhos inclusive no comércio. Quem ganha esse valor não poupa, consome. Automaticamente volta para a economia e em tributos”, avalia a economista.

31 dezembro 2021

O que dá para comprar com o salário mínimo de 2022 no Brasil?

O valor de R$ 1.212 não chegará a ser suficiente para comprar duas cestas básicas por mês na cidade de São Paulo em janeiro, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). A projeção é que a cesta básica custará em torno de R$ 700 na capital paulista em janeiro.

A cesta básica - composta por 13 itens - tem valores que variam entre as regiões do país e, por isso, representa uma parcela diferente do salário mínimo em cada uma delas. Na maioria das 17 capitais pesquisadas, no entanto, o preço da cesta representa mais da metade do salário mínimo.

O preço mais baixo, de R$ 473,26 (46,5% do salário mínimo), foi encontrado em Aracaju. O mais alto, de R$ 710,53 (aproximadamente 70% do salário mínimo), foi registrado em Florianópolis. Os dados são referentes a novembro de 2021, com cálculo baseado no salário mínimo vigente no momento.

Uma família, é claro, não tem só a conta do mercado para pagar. Para o Dieese, o valor do salário mínimo deveria estar em quase R$ 6 mil, considerando o nível de preços no país (também em relação a novembro de 2021). Isso é quase cinco vezes o valor estabelecido para o ano novo.

Gasolina e dólar

A título de referência, o novo salário mínimo também pode ser comparado a outros itens cuja alta chamou atenção em 2021.

Um salário mínimo inteiro equivale a encher três vezes um tanque de carro de 60 litros, considerando o preço médio da gasolina comum (R$ 6,684) em dezembro de 2021.

Se for comparado à cotação do dólar no último dia de 2021, o novo salário mínimo corresponde a US$ 217.

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O que explica alta de preço em produtos que subiram mais de 30%

Sem aumento real

O valor do salário mínimo de 2022, de R$ 1.212, foi confirmado em medida provisória publicada nesta sexta-feira (31/12) e vale a partir de 1º de janeiro.

O aumento de R$ 112 em relação ao valor que vigorou durante o ano de 2021 (R$ 1.100) não representa aumento real, mas apenas a recomposição de perdas inflacionárias.

Para esse cálculo, é usada a taxa de inflação medida pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) - que abrange as famílias com rendimentos de 1 a 5 salários mínimos e tem por objetivo a correção do poder de compra dos salários.

O Ministério da Economia diz que o cálculo do novo salário mínimo considerou uma alta de 10,02% como INPC previsto para todo o ano de 2021. "Neste percentual, foram considerados os valores realizados do INPC para os meses de janeiro a novembro e as projeções do governo para o mês de dezembro", diz a nota.

Além disso, o governo diz que o valor considera o chamado resíduo: a diferença entre a variação do INPC ocorrida em dezembro de 2020 e a estimativa dessa variação considerada quando foi feita a fixação do salário mínimo (de 2021) no fim de 2020.

A pasta diz que o novo valor atende ao estabelecido na Constituição Federal, que determina a preservação do poder aquisitivo do salário mínimo.

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Consumo de carne por habitante estimado para 2021 é o menor desde 2005

O governo estima que, para cada aumento de R$ 1 no salário mínimo, as despesas com benefícios da Previdência, abono e seguro desemprego, além de Benefícios de Prestação Continuada da Lei Orgânica de Assistência Social e da Renda Mensal Vitalícia, sobem aproximadamente R$ 364,8 milhões no ano de 2022.

O Dieese defende que deveria haver não apenas uma recomposição do salário mínimo, mas um aumento real, ao afirmar que os aumentos de preços - principalmente em alimentação e bebidas, transportes e habitação - afetou principalmente os trabalhadores com renda muito próxima ao salário mínimo.

"Aqueles trabalhadores com renda muito próxima ao salário mínimo foram os mais afetados com o rebaixamento drástico do poder de compra", diz a entidade.

Mais 56 milhões de pessoas têm rendimento referenciado no salário mínimo, entre beneficiários do INSS e trabalhadores privados e públicos, segundo o Dieese.

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