Como os organizadores prévios não são apenas comparações introdutórias eles

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ORGANIZADORES PRÉVIOS PARA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA

EM FÍSICA: O FORMATO CURTA DE ANIMAÇÃO

*Mestre em Ensino de Ciência

e Tecnologia, Universidade

Tecnológica Federal do Paraná

(UTFPR). Professor do Instituto

Federal do Paraná – IFPR.

Email:

**Doutora em Ciência dos

Materiais pela Universidade

Federal do Rio Grande do Sul

(UFRGS), 2003. Professor

da Universidade Tecnológica

Federal do Paraná (UFTPR).

Email:

*** Doutor em Simulação -

Institut National Des Sciences

Appliquées de Rouen (2004).

Professor da Universidade

Tecnológica Federal do

Paraná(UFTPR).

Email:

RESUMO: A teoria da aprendizagem signicativa enfatiza a importância da

ancoragem seletiva entre ideias já existentes e as ideias novas no processo de

aquisição de conhecimentos. A eciência desse processo depende, entre

outros fatores, da presença de subsunçores. Na falta deles, pode-se incluir

organizadores prévios, mecanismos didáticos que auxiliam a preparação

de ideias âncora. Esta pesquisa investigou a construção de um organizador

prévio no formato de curta de animação digital, discutindo os critérios

didáticos e técnicos envolvidos nessa tarefa. Um curta foi criado e aplicado

em uma aula de Física, se mostrando efetivo na função de organizador

prévio. O trabalho enumera características que orientam a construção de

um curta de animação com função de organizador prévio.

Palavras-chave: Aprendizagem Signicativa; Organizador Prévio; Curta

de Animação.

ADVANCE ORGANIZERS FOR MEANINGFUL LEARNING IN PHYSICS: THE ANIMATED

SHORT FILM FORMAT

ABSTRACT: Meaningful Learning Theory stresses the importance of the

link between existing ideas and new information, during the knowledge

acquisition process. The efciency of this process depends, among other

factors, on the presence of subsumers. In the absence of these elements,

previous organizers may be employed. They are learning resources that help

to prepare anchoring ideas. This research investigates the implementation

of an advance organizer in the form of a short-length digital animation.

We discuss the educational and technical criteria involved in this task. An

animation was created for a Physics class and proved to be effective in the

role of advance organizer. The paper enumerates guidelines to create a

short animation with the function of advance organizer.

Keywords: Meaningful Learning; Advance Organizer; Animated Short Film.

Rafael João Ribeiro*

Sani de Carvalho Rutz da Silva**

André Koscianski***

Rafael João Ribeiro | Sani de Carvalho Rutz da Silva | André Koscianski

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1. INTRODUÇÃO

Em 1963 David Ausubel escreveu Psicologia da Aprendizagem Verbal Signi-

cativa1, que mais tarde se tornou um livro clássico na área de Educação e uma

alternativa para os educadores da época, insatisfeitos com as teorias de aprendi-

zagem por descoberta.

Em sua obra, Ausubel apresenta a teoria cognitiva de aprendizagem signi-

cativa por recepção, em oposição a uma aprendizagem por memorização. A palavra

“receptiva” é usada por ele para indicar que os conteúdos a serem aprendidos são

estabelecidos pelo professor, em contraste com a aprendizagem por descoberta. A

ideia de recepção não signica que exista uma atitude passiva dos alunos ou que o

processo seja menos eciente; ao contrário, esse tipo de aprendizagem pode ocupar

menos tempo do aluno e ser mais tecnicamente organizado (OLIVEIRA, 1975).

Ausubel partiu da premissa de que a aquisição e retenção de conhecimento

resultam de um processo ativo, integrador e interativo entre o material de instru-

ção e as ideias relevantes da estrutura cognitiva do aprendiz. Para um conteúdo

“adquirir signicado” é importante que haja a associação da nova informação com

um conjunto de conhecimentos previamente existentes na estrutura cognitiva do

indivíduo (AUSUBEL, 2003).

Dentro da teoria da aprendizagem signicativa, o conceito de “subsunçor”

se refere a uma ideia já presente na estrutura cognitiva do aprendiz, responsável por

fazer a interação ou ponte cognitiva daquilo que já sabe com a nova informação. É

através do subsunçor preexistente que o aprendiz poderá fazer uma âncora com a

nova informação, promovendo, desta forma, uma aprendizagem signicativa, menos

mecânica e com mais sentido.

Em um primeiro momento, a ausência de subsunçores impede ou inibe o

processo de aprendizagem significativa. Entretanto, nesse caso Ausubel propõe o

uso de organizadores prévios: materiais introdutórios que antecedem os conteúdos a

serem aprendidos, tratando-os de maneira genérica. Os organizadores prévios ajudam

a aprendizagem signicativa por salientarem aos alunos informações com as quais já

tenham familiaridade e que servirão como substrato para a assimilação do material novo.

No caso do ensino de Física, existe uma diculdade com conceitos

abstratos ou pouco intuitivos, como é o caso de modelos matemáticos de di-

versos fenômenos. Muitos conteúdos envolvem também processos dinâmicos

que são ilustrados e discutidos por meio de representações estáticas, como

guras e digramas em livros e no quadro. Essas representações podem trazer

dois problemas aos alunos. Primeiro, elas exigem um esforço de abstração e

a capacidade de manter o foco de atenção em algo não palpável. Em segundo

lugar, há, em geral, uma diculdade dos estudantes para fazer a relação entre,

por exemplo, um termo de uma equação e um elemento concreto de um fenô-

meno físico. Isso pode levar a consequências como uma compreensão super-

cial do conteúdo e alunos que não conseguem generalizar além de situações

discutidas em sala.

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Curta de Animação com Função de Organizador Prévio

Muitos professores buscam enriquecer a aula e contornar os problemas

usando maquetes ou, quando possível, equipamentos em laboratório. Um recurso

bastante exível vem das Tecnologias de Comunicação e Informação, na forma

de simuladores e vídeos que ilustram situações concretas. Além de favorecer a

atenção dos alunos e ser um motivador potencial, os vídeos também constituem

um meio privilegiado para representação de conteúdos por permitirem mesclar

imagens reais, desenhos, grácos e textos.

Neste trabalho, estabeleceu-se a hipótese de que um curta de animação teria

função de organizador prévio se envolvesse um determinado conceito ou princípio

a ser estudado e o apresentasse de maneira signicativa para o aprendiz. A palavra

signicativa” é empregada aqui para se referir a um processo de ancoragem seletiva,

não arbitrário e não literal, dependente da disponibilidade de subsunçores relevantes.

O artigo discute aspectos da teoria de aprendizagem signicativa, tendo

em vista a construção de um curta de animação para auxiliar a aprendizagem de

um conceito da Física: o “Momento de uma Força”. A escolha da função de orga-

nizador prévio leva ao fato de que o conteúdo a ser ensinado não é tratado explici-

tamente. Isso traz uma vantagem adicional que é a total exibilidade ao professor

para abordar a matéria da maneira que for mais apropriada.

Neste trabalho, um vídeo foi inteiramente produzido de forma digital,

usando apenas softwares livres. A aplicação em sala de aula, os resultados e im-

pressões dos alunos são também discutidos no texto. Finalmente, é traçado um

paralelo entre as características de organizadores prévios e curtas de animação de

propósito didático.

2. METODOLOGIA

O objetivo geral deste trabalho foi a construção do curta de animação com

a função de organizador prévio, tratando o conteúdo “Momento de uma Força”,

que é pertinente à disciplina de Física do Ensino Médio. O vídeo deveria promover

a disponibilidade cognitiva dos alunos e a ancoragem seletiva de ideias, sendo

um instrumento viável para realizar essas funções e equivalente a outras mídias

possíveis (MULLER, 2008). A pesquisa contou com a aplicação em sala de aula em

uma turma do terceiro ano do Ensino Médio, na cidade de Arapoti, no Paraná. Os

trinta e oito alunos participantes tinham uma média de idade de 16 anos.

A escolha do formato vídeo implicou determinar as características relevan-

tes, didáticas e técnicas para esse tipo de material didático. O projeto foi organiza-

do em dois eixos principais: planejamento do método de ensino e planejamento da

produção do curta. Em síntese, pesquisaram-se as etapas necessárias para concep-

ção, produção e aplicação em sala de aula de um curta de animação com a função

de organizador prévio.

O ponto de partida para a construção de um roteiro de vídeo é a

escolha do gênero a ser empregado, entre opções como documentário, comédia

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ou suspense (MILLERSON, 2001). A partir dos objetivos do trabalho, durante

a etapa de pré-produção selecionou-se uma estrutura clássica formada por três

atos (COMPARATO 1983) para o roteiro: I ato: exposição do problema; II ato:

complicação do problema; III ato: resolução. Procurando garantir o envolvimento

dos alunos, optou-se por um argumento leve e que trouxesse algum humor. Para

cumprir a função de organizador prévio, o roteiro deve ser capaz de preparar os

aprendizes com ideias âncora, necessárias para assimilação do conteúdo principal

que seria posteriormente apresentado. Essas ideias âncora (subsunçores) devem

ser manifestadas pelos próprios alunos, e para resolver o aspecto da concepção do

curta, foram empregadas estruturas cognitivas hipotéticas.

A escolha de ferramentas de criação e edição digital foi realizada com base

na experiência da equipe. Cogitou-se, no início dos trabalhos, a participação de um

desenhista prossional, porém, os primeiros ensaios e esboços feitos por um dos

autores, já usando os softwares selecionados, mostraram qualidades estéticas julga-

das plenamente adequadas pelo grupo de pesquisa. O aspecto artístico do trabalho

foi sempre ponderado com cuidado, por ser considerado muito importante para

um envolvimento afetivo positivo dos alunos com o material.

O resultado nal do processo de criação do vídeo é um arquivo digital,

contendo os quadros de animação codicados. A produção de cada quadro de ani-

mação no computador é denominada renderização e pode ser bastante demorada.

Neste trabalho, a renderização foi realizada usando uma rede de computadores.

No planejamento da aula, utilizou-se a abordagem descrita por Joyce e

Weil (1996). Ela pode ser aplicada com materiais diferentes de vídeos, como textos

e imagens, empregados com a função de organizadores prévios. A distribuição de

horários da escola limitou a aula de aplicação a 45 minutos; isso levou os pesqui-

sadores a restringir a duração do curta dentro da aula, estabelecendo-se um tempo

máximo de 5 minutos, prevendo um tempo de preparação e outro lapso ao nal

da projeção para manifestações da turma.

Foram utilizados pré-testes e pós-testes, além do registro de comentários

dos alunos participantes. Esse material forneceu indicações que contribuíram com

conclusões do trabalho. Os testes foram baseados no material desenvolvido por

Costa (1989), que aborda o conceito de momento de uma força.

3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.1. Aprendizagem significativa

A aprendizagem signicativa é parte de um processo de assimilação que

pode ser dividido em fases explicadas pela teoria da assimilação, de Ausubel (2003).

Pode-se sintetizar essas fases do seguinte modo: (1) ancoragem seletiva do material

de aprendizagem com as ideias na estrutura cognitiva; (2) construção do produto

interativo, resultante da combinação das ideias recém-introduzidas com as ideias

relevantes existentes; (3) assimilação obliterante, em que a ideia nova e as inicialmente

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Curta de Animação com Função de Organizador Prévio

existentes tornam-se progressivamente indissociáveis; (4) surgimento de novos sig-

nicados, subsunçores modicados passíveis de retenção ou esquecimento.

Na falta de subsunçores, sugere-se o uso de organizadores prévios, que são

mecanismos pedagógicos auxiliadores na ligação entre aquilo que o aprendiz já sabe

e aquilo que irá adquirir. A justicativa para o uso dos organizadores prévios vem do

fato de que as ideias existentes na estrutura cognitiva do aprendiz podem não ter a

relevância e o conteúdo sucientes para estabelecerem ligações com as novas ideias

introduzidas pelo material de instrução. Nesse caso, o organizador prévio faz o papel

de mediador e também faz a alteração das ideias preexistentes, preparando-as para

o estudo do material posterior: “apresentam-se os organizadores a um nível mais

elevado de abstração, generalidade e inclusão do que os novos materiais a serem

aprendidos” (AUSUBEL, 2003, p. 11). Para isso, os organizadores prévios devem sa-

lientar os pontos mais evidentes do material e omitir informações menos importan-

tes; eles auxiliam o estudante a realizar sua própria codicação da nova informação

na memória (GAZDA, R., FLEMISTER, 1998). A Figura 1 representa a função dos

organizadores prévios na aprendizagem signicativa.

Figura 1: Representação do organizador prévio como facilitador da ancoragem seletiva.

A ancoragem seletiva funciona como uma associação entre alguns

dos conhecimentos preexistentes e o material novo. O organizador prévio não

antecipa conteúdos novos, mas facilita tecer relacionamentos lógicos entre eles e a

estrutura cognitiva existente. É relevante comentar que os organizadores prévios

não facilitam a aprendizagem de informações ‘sem signicado’ (NOVAK, 1981).

Os organizadores prévios podem ser divididos de acordo com a forma de

aplicação. Quando apresentados antes do material principal de aprendizagem, são

denidos como pré-organizadores, que são uniformemente mais ecazes do que

os pós-organizadores (MAYER e BROMBAGE, 1978 apud AUSUBEL, 2003).

Também podem ser divididos em expositivos e comparativos. Os expositivos são

usados com conteúdos novos, relativamente desconhecidos, de forma a fornecer

subsunçores relevantes. No caso de material de aprendizagem relativamente fa-

miliar, podem ser empregados organizadores prévios comparativos, que auxiliam

na discriminação entre as ideias novas e as existentes (AUSUBEL, 2003). Uma

1. Estrutura

cognitiva inicial

2. Apresentação

do organizador

prévio

3. Apresentação

da nova ideia

e ancoragem

seletiva

4. Assimilação

obliterante

Subsunçores

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terceira categoria possível são os pseudo-organizadores, elaborados para facilitar a

aprendizagem de tópicos múltiplos e heterogêneos (FARIA, 1989).

Embora seja comum o uso de organizadores prévios na forma de texto,

eles podem aparecer também como gravuras, mapas conceituais, lmes, debates,

dramatizações e demonstrações em geral (MOREIRA, 2006).

3.2. Estruturas cognitivas hipotéticas

Um organizador prévio prepara o terreno para a chegada de novas infor-

mações, ativando memórias, destacando conceitos e conhecimentos prévios que o

aluno tenha e que poderão ser usados para ancorar as novas informações. Assim,

para iniciar a concepção do vídeo, foram elencadas estruturas cognitivas hipoté-

ticas buscando prever as ideias relevantes já disponíveis. Essas estruturas servem

de guia para o professor no papel de diretor do processo de ensino-aprendizagem.

Três exemplos são ilustrados na Figura 2 a seguir2.

Figura 2: Exemplos de estruturas cognitivas para assimilação de conceitos.

Os três tipos de estruturas ilustrados são:

(1) Aprendizagem subordinada derivativa: a ideia nova (momento de uma força) é

Balança

Alavanca Chave

de fenda

Alavanca Chave de

fenda Balança

Aprendizagem subordinante

Momento de

uma forçca

Força Força

Trabalho Momento de

uma forçca

Trabalho Impulso Impulso

Aprendizagem subordinada derivativa

Comprimento

de braço de

alavanca

Razão Razão

Alavancas

Proporção

Aprendizagem combinatória

Momento de

uma forçca

Proporção

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Curta de Animação com Função de Organizador Prévio

ligada a uma ideia subordinante já existente (força) e representa um exemplo ou

extensão desta. A ideia estabelecida não é modicada.

(2) Aprendizagem subordinante: as ideias já estabelecidas, como exemplos de ala-

vancas, são reconhecidas como casos mais especícos da nova ideia de momento de

uma força. Essas ideias antigas transformam-se em ramicações hierarquicamente

inferiores da ideia nova.

(3) Aprendizagem combinatória: a ideia nova é relacionada com uma ou mais

ideias estabelecidas por analogia3, devendo existir alguns atributos em comum

entre ambas. Por exemplo, a ideia já existente de “razão e proporção” pode auxi-

liar a compreensão da relação entre força e distância na construção da grandeza

momento de uma força.

3.3. Abordagem em sala

Para estruturar uma aula que empregue o vídeo, tomou-se como referência

o Método Organizador Prévio sugerido por Joyce e Weil (1996). Esse modelo é com-

posto por quatro fases, sumarizadas na Tabela 1.

Tabela 1: Fases do Método Organizador Prévio de Joyce e Weil (1996).

Método Organizador Prévio

Fase I apresentar o organizador prévio

Fase II apresentar o material principal de aprendizagem

Fase III fazer a ligação das ideias presentes no organizador prévio com as ideias do material

de aprendizagem

Fase IV aplicar a nova aprendizagem em uma tarefa

No presente trabalho, a aula pode ser descrita desta forma:

na Fase I o professor aplica um pré-teste de conhecimentos e apresenta o

curta de animação. Em seguida, promove a participação dos alunos, com comen-

tários e indagações sobre o que entenderam do vídeo. A aula prossegue depois que

o professor identica subsunçores no diálogo com os alunos;

na Fase II, o material principal de aprendizagem é apresentado com

informações do livro didático habitual dos alunos e exposição de ideias no

quadro de giz. Cabe explicar que seguir rigorosamente o livro didático era uma

imposição da escola;

na Fase III o professor intervém para ajudar os alunos a construir

signicados. Para isso, foram elaborados slides buscando a ancoragem do con-

ceito apresentado na fase II com as cenas mais importantes da animação apre-

sentada na fase I;

na Fase IV é realizado um teste de vericação de aprendizagem. Nesta

pesquisa, foi usado um pós-teste com o propósito de gerar dados de comparação

com o pré-teste. Foram usadas questões adaptadas da pesquisa de Costa (1989).

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4. PRODUÇÃO DO CURTA DE ANIMAÇÃO

Os processos de planejamento e construção de um vídeo didático podem

ser divididos em três tipos de atividades (FERRÉS 1996 p. 92): básicas; comple-

mentares e organizacionais. A Tabela 2 lista esses processos.

Tabela 2: Tarefas na produção de um vídeo (Ferrés, 1996, p. 92).

Atividades Básicas Atividades Complementares Atividades Organizacionais

Delimitação do projeto Busca de documentação Previsão de necessidades

Sinopse Fichas de conteúdo Possibilidades e limitações

Roteiro literário Notas Plano de realização

Roteiro técnico Observações

Realização Apontamentos

Pós-realização Roteiro didático

A construção do vídeo considerou as atividades da Tabela 1 dentro das

três etapas clássicas de produção desse tipo de material (MILLERSON, 2001):

pré-produção, produção e pós-produção. Essa forma de trabalho provou ser uma

maneira prática e efetiva de organização. As etapas são descritas a seguir.

4.1. Pré-produção

Na pré-produção foram discutidas alternativas de roteiro para ilustrar

o conceito de “Momento de uma Força” em situações diferentes e corriqueiras.

Para evitar algo semelhante a uma videoaula, propôs-se criar uma história sem

comunicação verbal.

Duas características repercutiram sobre o formato do vídeo. A primeira foi a

escolha da função de organizador prévio, que limitou o conjunto de informações a ser

tratado. A segunda foi trabalhar com um vídeo curto, tanto para atender a um critério

de baixa carga cognitiva (MULLER, 2008), quanto para garantir o nível de atenção

dos alunos. Dessa maneira, o formato curta-metragem se mostrou mais adequado.

A adaptação de um vídeo em uma estratégia pedagógica depende da

concepção de ensino empregada. Para aplicar a teoria de Ausubel, um vídeo

pode ter função de organizador prévio se preparar os aprendizes com ideias ân-

coras relevantes antes da apresentação do material principal. Para isso, o vídeo

deve seguir um roteiro que diz respeito ao assunto da aula sem fazer abordagem

direta ou explícita do conteúdo, ou seja, o roteiro deve evocar conhecimento

prévio que será útil na sequência. Ao fazê-lo, pode ser observada a defi-

nição e o uso de um sistema simbólico (SALOMON, 1994) ou metafórico

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Curta de Animação com Função de Organizador Prévio

(KOSCIANSKI, 2010) para representar as ideias a serem veiculadas. O argu-

mento4 para o vídeo proposto foi:

“O curta-metragem “Momento de uma Força” apresenta a história de uma personagem

em diculdade para trocar o pneu furado de sua caminhonete. O protagonista é um senhor de

cabelos brancos e franzino que, logo após retirar a caminhonete da garagem de sua casa, percebe

que um dos pneus está furado. Então, retira com calma o equipamento necessário para troca do

pneu, como chave de roda, macaco e pneu estepe. Surge um problema quando, mesmo com muita

força e várias tentativas diferentes, não consegue afrouxar o parafuso da roda usando uma chave

convencional. Em outra cena, um passarinho começa a pular nas hastes de uma antena de TV

sobre o telhado. O passarinho quebra as hastes quando pula mais próximo das suas extremidades.

A personagem principal observa a ação do passarinho e estende o tamanho da chave de roda

encaixando nela um cano. Quando nalmente consegue retirar o parafuso, o passarinho o rouba e

voa para longe, fechando o vídeo.”

Na realização do roteiro decidiu-se empregar o recurso da exageração,

comum nos desenhos animados clássicos. A exageração é utilizada para enfa-

tizar os movimentos e as emoções da personagem e também pode ser usada

para passar conceitos abstratos com maior ênfase (CHAMPOUX 2001). Outro

ponto importante foi a elaboração do clímax, que deveria ter um impacto dra-

maticamente forte.

4.2. Produção e pós-produção

Uma vez pronta a história, teve início a tarefa de projeto de personagens

(FORD e LEHMAN, 2002). Dada a relativa simplicidade do roteiro, não houve

grandes questões a resolver, como denir com precisão traços psicológicos. A

aparência do protagonista foi inspirada na personagem de um famoso lme de

cção cientíca. Denido o aspecto geral da personagem, iniciou-se a modelagem

tridimensional de objetos e personagens (AVGERAKIS, 2004).

A criação de uma animação digital assemelha-se a uma filmagem

tradicional. Após a modelagem e animação de movimentos, como caminhada,

seguem as tomadas de cena usando câmeras virtuais dentro de um software de

animação. Isso envolve posicionar e regular as câmeras em posições que são

designadas comumente por termos na língua inglesa, como close-up, wide shot, mid

shot (MILLERSON, 1994).

A última parte da produção é a renderização. Nesse processo, o compu-

tador gera cada quadro de animação, o que envolve recalcular as posições dos per-

sonagens, efeitos de sombra e reexão. Dependendo do nível de detalhe desejado

e da resolução empregada, um único quadro do vídeo proposto poderia ocupar

tempos da ordem de um minuto em um PC típico (conguração de máquinas no

mercado em 2010). Neste trabalho, lançou-se mão de tempo de processamento

gratuito de redes de computadores existentes na internet, conhecidas como render

farm (PATOLI et al, 2009).

Concluída a renderização, foram acrescentados os efeitos sonoros e uma

trilha musical de fundo. Alguns quadros do vídeo são vistos na Figura 3.

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Figura 3: Quadros capturados do curta de animação

As tarefas de produção do curta de animação podem ser resumidas da

seguinte forma:

1. Modelagem da personagem principal e criação de texturas.

2. Criação do esqueleto da personagem principal.

3. Modelagem do cenário e dos objetos que o compõe.

4. Modelagem da personagem secundária, o passarinho.

5. Animação das asas do passarinho.

6. Efeitos de partículas para cabelo, sobrancelhas e grama.

7. Iluminação do ambiente, conguração de reexos e sombras.

8. Conguração das câmeras.

9. Animação das ações da personagem e dos objetos em interação.

10. Denição de movimentação das câmeras.

11. Animação da personagem secundária.

12. Renderização, totalizando 3.950 quadros.

13. Inclusão de efeitos sonoros e sincronismo com as ações.

14. Edição da trilha sonora.

15. Edição de vídeo e efeitos de transição de cenas.

Terminado o vídeo, foram adicionadas telas de título e de créditos nais,

além de efeitos de vídeo ou efeitos sonoros extras. O vídeo foi comprimido em

formato NTSC 720x480 em qualidade de DVD, com taxa de 30 quadros por se-

gundo. Toda a produção foi realizada com o software Blender 2.48 (HESS, 2007),

conjunto completo de criação 3D de licença pública GPL (FITZGERALD, 2006).

O tempo total de produção foi aproximadamente 180 homens-horas, ou quarenta

e cinco dias com média de quatro horas por dia.

4.3 Pré-estreia

Um primeiro teste da animação foi realizado com três alunos do primeiro

ano e dois alunos do terceiro ano do Ensino Médio. Cada aluno recebeu, numa

sexta-feira, um DVD e foi orientado a assisti-lo em casa, com a tarefa de discutir

com os familiares o conceito de Física envolvido na história e escrever suas opi-

niões. Um dos alunos do primeiro ano, que ainda não havia tido esse conteúdo de

Física, escreveu este e-mail:

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Curta de Animação com Função de Organizador Prévio

“professor, gostei bastante do vídeo, acho que consegui aprender que a força deve ser feita na ponta. Eu

acho que a ideia foi passada com sucesso e também acho que mais pessoas deveriam assistir, pois é muito

interessante e esses vídeos deixam a aula menos cansativa”.

Nesse comentário, pode-se observar que o vídeo foi capaz de promover a

principal condição para aprendizagem signicativa. A ideia relevante observada no

comentário é a noção prévia de “força”, já existente na estrutura cognitiva. Outro

aluno do terceiro ano do Ensino Médio fez o seguinte comentário:

Assisti o vídeo e achei uma maneira muito interessante de demonstrar o conteúdo, tornando mais fácil

o entendimento a partir de um recurso diferenciado [sic]. Fica claro ainda como princípios básicos da

Física podem facilitar situações cotidianas. Tem a ver com o “Princípio da Alavanca”, de Arquimedes?

Pesquisei aqui, hahaha! Excelente forma de explicar”.

Outra vez percebe-se que o roteiro é potencialmente signicativo, pois

o aluno também estabeleceu uma relação com ideias relevantes – neste caso, o

Princípio da Alavanca”. Além disso, o aluno se mostrou motivado a realizar esponta-

neamente uma pesquisa sobre o conceito presente no curta de animação.

5. APLICAÇÃO EM SALA DE AULA

Após os testes iniciais, preparou-se a aplicação do material na sala de aula,

especicamente para abordar o conteúdo de “Momento de uma Força”. Foi ob-

servada a organização descrita no Quadro 1.

As etapas desse processo são descritas a seguir.

5.1. Pré-teste

A primeira ação do professor em sala foi aplicar as questões do pré-teste,

adaptadas de Costa (1989). As cinco questões do pré-teste avaliaram o conhecimento

prévio, teórico ou empírico, dos 38 alunos sobre o conceito “Momento de uma Força”.

A primeira questão investigou se os alunos lembravam da aula sobre esse

conteúdo de anos anteriores; apenas 10% respondeu que sim. A segunda questão

foi “Você sabe o signicado do conceito ‘Momento de uma Força’?”, e apenas um

aluno respondeu conhecer sem dúvidas.

As questões 3 e 4 do pré-teste foram retiradas da pesquisa de Costa

(1989). A questão 3 ilustrou um homem com um rodo na mão e perguntou como

ele poderia equilibrar o rodo na posição horizontal; houve 57% de acertos. A

quarta apresentou guras de gangorras e crianças e envolveu determinar ponto de

equilíbrio, com 82% de acertos.

A quinta e última questão ilustrou um prego, uma tábua e um martelo.

Havia duas situações semelhantes, com valores de posição e intensidade de forças

diferentes, sendo que 71% dos alunos acertaram.

Além do registro de pré-teste, coletou-se a opinião do professor

em relação ao conhecimento dos alunos. Ele lecionava para a mesma turma

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havia quatro anos e tinha identificado um problema de ambiguidade com

a palavra “momento”.

5.2. Exibição do vídeo

Após o pré-teste, os alunos foram orientados a assistir ao curta-metragem.

Durante as cenas iniciais, eles permaneceram atentos, sem signicativas expressões

corporais. Em um dado momento a personagem se equilibra na borda da caçamba

do caminhão e cai no chão, o que provocou muitos risos e interações entre os

alunos. Até o nal do curta os alunos não se expressaram verbalmente; as únicas

manifestações percebidas foram risadas, sons de espanto ou de surpresa e

expressões corporais como resposta às ações da personagem.

5.3. Após a exibição do vídeo

Após a projeção, o professor passou a dirigir verbalmente e intencional-

mente os comentários dos alunos.

O primeiro comentário foi de um aluno que, coincidentemente ou não,

era pouco participante das aulas. Ele perguntou se a história tinha relação com o

estudo das alavancas. Isso abriu um leque de opções para os demais, que passaram

a citar exemplos de situações de aplicação do conceito “momento”. A cada exem-

plo, o professor reforçou com uma explicação, salientando como o conceito se

fazia presente no cotidiano. Um exemplo prático, motivado por outro comentário,

foi utilizar a porta da sala de aula para uma demonstração. Um aluno foi convidado

a participar e desaado a empurrar a porta com as mãos próximo das dobradiças,

enquanto o professor a mantinha aberta com um dedo.

Depois dos comentários, o conceito foi explorado no quadro de giz, com

a denição de “Momento de uma Força” e desenhos pictóricos seguidos de dia-

gramas vetoriais. Foi explicada a inuência do ângulo de aplicação da força em

relação ao braço de atuação no módulo da grandeza “momento”. Também foi

explicada a convenção de sinais para sentido horário e anti-horário. Durante a

exposição foram feitas referências ao problema da personagem na animação.

Durante as interações com a turma, houve o cuidado de o professor tentar

mediar a participação de todos os alunos, sabendo-se que certos comentários, ou

situações como confrontos, podem dicultar uma comunicação aberta e espon-

tânea ou bloquear totalmente alunos mais inibidos (FERRÉS 1996, p. 81).

5.4. Pós-teste

Na última parte da aula, realizou-se um pós-teste optativo, sem objetivo

de avaliação formal. Todos responderam às questões.

Havia dez questões objetivas. As cinco primeiras foram questões para

sondar a receptividade de se usar um curta de animação. A sexta e sétima questões

vericaram se os alunos entenderam a mensagem. As três últimas trataram da

grandeza “Momento de uma Força” e, por m, um espaço para comentários livres.

As respostas dos 38 alunos nas primeiras cinco questões mostraram que: 100%

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Curta de Animação com Função de Organizador Prévio

sabia o que era um curta de animação; 100% gostava de lmes de animação; 95%

gostou da animação feita pelo professor; 100% concordou que curtas de animação

podem auxiliar o ensino de Física; e 97% gostaria de repetir o método de ensino.

A sexta questão abordou a cena em que o passarinho pulava nas hastes

da antena de TV. Todos perceberam e entenderam que pular na ponta da haste

aumentava a possibilidade de quebrá-la. A sétima questão averiguou o entendi-

mento sobre a solução usada pela personagem para afrouxar o parafuso, também

com 100% de acerto. Nas respostas às últimas questões observou-se que 95% dos

alunos foram capazes de identicar em situações corriqueiras a aplicação correta

do conceito “Momento de uma Força”; 92% acertou um problema similar à quinta

questão do pré-teste; e 76% compreendeu a inuência do ângulo entre o vetor

força e a direção do braço na intensidade do momento.

Trinta e três alunos registraram comentários adicionais. Eles foram dividi-

dos em cinco categorias: (I) 13 alunos comentaram que a aula proporcionou melhor

aprendizagem; (II) 5 alunos observaram que a aula proporcionou maior participação;

(III) 7 alunos opinaram que a aula foi diferente das outras; (IV) 7 alunos destacaram a

utilização da animação como recurso didático; (V) 10 alunos zeram comentários

positivos que não foram classicados nas categorias anteriores. Alguns comen-

tários foram classicados em mais de uma categoria e nenhum teve teor nega-

tivo. Alguns deles são apresentados na Figura 4.

Figura 4: Imagens digitalizadas de comentários dos alunos.

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6. DISCUSSÃO

A análise dos resultados à luz dos critérios apontados pela literatura foi

favorável no que diz respeito ao vídeo atingir o m proposto.

As respostas das questões do pós-teste, comparadas com as do pré-teste, permi-

tiram vericar que, em geral, os alunos assimilaram o signicado correto do con-

teúdo “Momento de uma Força”. Apenas a décima questão do pós-teste teve um

menor número de acertos, 76%. Muitos alunos ainda manifestaram dúvida sobre

a inuência que o ângulo do vetor da força aplicada tem sobre o momento. Esse

fato pode motivar uma extensão do vídeo, mostrando um pássaro pousado sobre

uma haste vertical e depois sobre hastes de inclinações diferentes.

As falas e os comentários dos alunos sobre a relação entre as cenas do

curta e seus conhecimentos prévios mostraram que o objetivo principal de toda a

preparação teórica que culminou no desenvolvimento do vídeo foi atingido, isto é:

detectou-se a presença de subsunçores. Embora a aprendizagem signicativa seja

individualizada e dependa da estrutura cognitiva de cada indivíduo, durante a aula

observou-se um resultado geral positivo. Isso foi coerente com o que se esperava

do uso de estruturas cognitivas hipotéticas.

A ocorrência de aprendizagem signicativa foi validada através da combi-

nação dos mecanismos de retorno, julgando-se bastante relevantes os comentários dos

alunos recolhidos no nal da aula. A impressão de que a aula teria proporcionado

melhor aprendizagem foi manifestada treze vezes – a categoria de comentário mais citada.

Um aspecto que também inuenciou os alunos foi o fato de a animação

haver sido elaborada por um de seus professores. Isso cou evidenciado pela cola-

boração e pelo comportamento dos alunos no dia da aula. O curta gerou uma res-

posta emotiva dos alunos, bastante evidente com as gargalhadas com o tombo da

personagem e a cena nal em que o passarinho rouba o parafuso. Houve também

um aspecto de entretenimento devido à semelhança com os clássicos dos dese-

nhos animados. No início do planejamento, a opção pelo gênero já visava alguma

diversão, mas sem correr o risco de distrair. A dosagem de diversão ou humor em

uma atividade envolvendo adolescentes deve ser cautelosa, pois poderia ocorrer

agitação ou euforia exagerada caso o roteiro não buscasse certa discrição.

Um risco no contexto da aula seria os alunos perceberem ou valorizarem

o curta de animação apenas como um componente afetivo. Todas as observações

coletadas mostraram que o valor educacional foi claramente reconhecido por eles.

Outro aspecto positivo na aplicação do curta-metragem em sala de aula é

a adaptação dentro do tempo, diferente dos lmes de longa-metragem. No colé-

gio em que se realizou o estudo, cada disciplina é apresentada em uma sessão de

quarenta e cinco minutos. A animação “Momento de uma Força” tem menos de

três minutos de duração, promoveu a imediata participação dos alunos e ótima

participação. Essa característica de tempo também foi comentada pelos alunos.

Este trabalho propôs três elementos básicos para desenvolver roteiros de

curta de animação com função de organizador prévio:

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Curta de Animação com Função de Organizador Prévio

um mundo: que seja signicativo para o aluno; e um ambiente favorável

para reproduzir situações que envolvem o conteúdo a ser aprendido;

uma personagem: que seja receptiva e curiosa na exploração do problema;

e que demonstre conhecimento do assunto no mesmo nível que o aluno;

um problema: que seja signicativo e que sirva como âncora entre o que

o aluno já sabe e aquilo que irá aprender. O desfecho do problema deve ser elabo-

rado para permitir discussões entre professor e alunos após a exibição do curta.

Como resultado nal, esta pesquisa apresenta uma síntese com aponta-

mentos que reforçam a produção de curtas de animação com função de organiza-

dores prévios, conforme observado na Tabela 3.

Tabela 3: Paralelo entre vídeos e organizadores prévios.

CURTAS DE ANIMAÇÃO ORGANIZADORES PRÉVIOS

Roteiros curtos e focados Conjuntos pequenos de informações

Envolventes e interpretativos Preparam para o material principal

Não são vídeo aulas Não apresentam o conteúdo principal

São de curta duração São pequenos materiais introdutórios

Linguagens de fácil entendimento

(público universal)

Linguagens sem termos técnicos

(alunos imaturos em termos cognitivos)

Iniciam com uma situação desestabilizadora Iniciam com estruturas cognitivas desorganizadas

Técnicas de antecipação ou de suspense Manipulação intencional de estruturas

cognitivas idiossincráticas

Despertam sentimentos e emoções Despertam disponibilidade para aprendizagem

7. CONCLUSÃO

Atualmente, o curta “Momento de uma Força” encontra-se em meio di-

gital em endereços eletrônicos5. Essa versão da animação possui dois minutos e

quarenta e sete segundos de duração. Um vídeo mostrando imagens da construção

do curta também se encontra disponível na internet6.

A criação do curta em meio digital facilita a sua utilização, pois vídeos na

internet podem ser copiados em mídias portáteis para serem exibidos em salas de

aula. Os vídeos digitais na internet também permitem o acesso pelos alunos, mesmo

fora da escola, ampliando as possibilidades de ensino-aprendizagem.

O curta de animação apresentou características relevantes sucientes para

validar sua utilização como organizador prévio. Portanto, cumpriu sua função

como um mecanismo pedagógico que efetivamente auxiliou na ligação entre aqui-

lo que o aprendiz já sabe e aquilo que precisa saber, ou seja, houve aprendizagem

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signicativa. Isso foi vericado através da manifestação e disposição dos alunos ao

relacionarem o novo material a ser aprendido, de forma não arbitrária e não literal,

à estrutura cognitiva idiossincrática.

É preciso estar atento ao custo de produção de um vídeo. Elaborar mate-

rial multimídia requer, via de regra, a participação de pessoal habilitado, como artistas

grácos. O trabalho aqui descrito congura uma exceção, em virtude da familiaridade

do pesquisador no uso do software de modelagem e demais ferramentas de edição.

Apesar disso, o tempo alocado na produção foi bastante extenso. Recomenda-se

que o professor responsável pela concepção didática seja auxiliado por pessoal apto

em desenho e animação, livrando-o, assim, de tarefas que podem ser extremamente

trabalhosas e também do risco de obter um resultado visual insatisfatório.

Finalmente, a metodologia e os apontamentos desta pesquisa (RIBEIRO,

2011) podem servir como modelos gerais para experiências futuras, em que um

curta de animação, feito ou não em computador, seja construído com a função de

organizador prévio ou aplicado dessa maneira em aula.

AGRADECIMENTO

Os autores agradecem à Fundação Araucária do Paraná pelo suporte nanceiro.

NOTAS

1 Título original: The Psychology of Meaningful Verbal Learning. Editora: Grune & Stratton, Nova Iorque,

1963.

2 É importante ressalvar que neste trabalho a representação gráca das estruturas cognitivas hipoté-

ticas não possui relação com os Mapas Conceituais de Novak (1981).

3 A ideia nova e a ideia já estabelecida não precisam necessariamente pertencer a uma mesma área de

conhecimento ou disciplina.

4 O argumento é um resumo da história na forma de texto utilizado para vericar a viabilidade me-

todológica e viabilidade artística de uma obra antes da sua produção.

5 http://www.youtube.com/watch?v=1jeMYJR6LJM ou http://vimeo.com/9162433.

6 http://www.youtube.com/watch?v=q3P2HRYoPgQ.

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Curta de Animação com Função de Organizador Prévio

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Data do Recebimento: 14/04/2011

Data de Aprovação: 24/11/2011

Data da Versão Final: 31/12/2011